Acidente do Trabalho

Reabilitação profissional realizada pelo INSS e a volta do trabalhador com baixa instrução para o mercado de trabalho

Reabilitação profissional prevista na lei 8.213/91

Existe no Brasil a garantia constitucional de bem estar e Justiça Social aos trabalhadores, porém, a realidade é muito distante da meta idealizada pelo texto da lei maior, uma vez que o sistema econômico atual tem por objetivo a obtenção de renda e capital e não a aplicação ou construção de um programa de proteção social efetivo. Essa garantia constitucional está plenamente ligada à garantia de uma adequada reabilitação profissional.

A lei de benefícios da Previdência Social número 8.213/91 estabelece em seu artigo 18, III, ‘c’ que o serviço de reabilitação profissional é devido ao segurado e também ao dependente.

Esse é um serviço prestado pela Previdência Social que não exige carência do segurado, conforme está estabelecido no artigo 26, V, da mesma lei de benefícios. Isso significa que o segurado do INSS não precisa realizar um número de contribuições mínimas para ter acesso ao serviço de reabilitação profissional.

O sistema de reabilitação profissional atualmente estabelecido pela legislação mencionada não funciona e muitas vezes é empurrado aos trabalhadores que ainda não possuem condições de retornar ao trabalho, mesmo em outra atividade que na teoria seria compatível com a atual situação clínica do trabalhador.

Na prática ocorre um sub aproveitamento da mão de obra deste trabalhador, que ao retomar suas funções após ter o auxílio-doença cessado é designado a retornar ao trabalho para realizar atividades de menor importância na empresa. Podemos indicar como exemplo um trabalhador que retorna à empresa e é designado para permanecer em um local ou sala atendendo telefone ou acompanhando o movimento de entrada e saída, quando não permanece totalmente ociosos sem nenhuma tarefa para realizar.

O foco desse artigo é abordar as principais características do sistema de reabilitação profissional, principalmente para o trabalhador com baixa instrução, com o objetivo de constatar a real eficácia da reinserção profissional desses trabalhadores no atual mercado de trabalho tão concorrido.

Regras gerais de reabilitação profissional pelo INSS e a consequência para o trabalhador com baixa instrução

A principal hipótese de reabilitação profissional é quando o segurado está temporariamente incapacitado para realizar as suas atividades profissionais na empresa e recebendo o benefício de auxílio-doença.

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Na redação fixada pelo artigo 62 da lei 8.213/91 é determinado que o segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade.

O benefício de auxílio-doença não deverá ser interrompido até que o segurado seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez.

É necessário pontuar alguns elementos que dão ensejo à reabilitação profissional estabelecido pela lei de benefícios previdenciários. Vejamos:

  • segurado que esteja recebendo auxílio-doença;
  • impossibilitado de obter uma recuperação para voltar a trabalhar na mesma atividade;
  • enquanto não houver a reabilitação do segurado o auxílio-doença não poderá ser cessado;
  • segurado após passar pelo processo de reabilitação profissional deverá ser capacitado para exercer outra atividade que lhe garanta a subsistência.

O elemento mais importante da reabilitação profissional é a capacitação do trabalhador para exercer alguma atividade labora que lhe garanta a subsistência.

Não podemos considerar que um trabalhador esteja totalmente reabilitado para voltar a prestar serviço quando a sua nova atividade para o qual foi designado não seja compatível com as suas habilidades, assim como o valor pago a título de remuneração dessa nova atividade deve ser equiparada à que o trabalhador percebia antes da reabilitação.

Infelizmente na prática o trabalhador reabilitado é designado para uma tarefa ou atividade de menor relevância e muitas vezes a empresa aceita esse trabalhador por imposição do INSS que cessa o auxílio-doença e alega que esse trabalhador já pode retornar ao trabalho, mesmo sem ter condições clínicas de realizar qualquer atividade laboral.

Muitas vezes, esse infortúnio pode acarretar uma incapacidade ao trabalhador de forma permanente ou temporária, total ou parcial e, seguindo esta linha, verifica-se que a incapacidade é uma forma de exclusão social, pois não apenas impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover o seu próprio sustento.

A consequência dessa sistemática errada é o agravamento do quadro clínico do trabalhador que além das sequelas físicas, sofre também sequelas psíquicas devido à sua situação de impotência e limitação física vista com preconceito pelo empregador e pelos colegas de trabalho.

Quando a incapacidade ocorre por doença profissional ou acidente do trabalho, ao ser reabilitado o trabalhador conta com um ano de estabilidade, porém, quando essa incapacidade não tem relação com a atividade desenvolvida na empresa, essa estabilidade provisória não existe.

Em qualquer das hipótese, com ou sem estabilidade, o trabalhador aguarda a empresa demití-lo ou por não mais aguentar a pressão o próprio trabalhador pede demissão, mesmo sabendo das graves consequências financeiras que irá sofrer com essa atitude.

É nesse momento que a situação se agrava, pois ao tentar retornar ao mercado de trabalho esse trabalhador que em algumas hipóteses não possui um grau de qualificação adequado, simplesmente não consegue uma nova oportunidade de trabalho por contar com duas restrições:

  • baixa qualificação profissional;
  • limitação física e psíquica para realizar algumas atividades.

Além dessas limitações que o trabalhador que não é reabilitado de forma adequada pelo INSS sofre, ele também está submetido à outras questões de natureza subjetiva como preconceito da empresa ter em seu quadro de funcionários um trabalhador que pode gerar problemas por ser elevado o risco desse empregado se afastar do trabalho, assim como o empregador quando vai analisar o currículo e realizar uma entrevista com dois candidatos à uma vaga, sendo um reabilitado e outro não, certamente a escolha será direcionada para aquele candidato que não apresenta problemas ou histórico clínico.

Embora o artigo 89 da lei 8.213/91 estabeleça que a habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive, esse objetivo está muito distante de ser efetivado e cumprido.

Negligência do Poder Público na fiscalização

É determinado pela própria legislação previdenciária no § 2ª do artigo 89 da lei 8.213/91 que compete ao Ministério do Trabalho e Emprego estabelecer a sistemática de fiscalização, bem como gerar dados e estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por pessoas com deficiência e por beneficiários reabilitados da Previdência Social, fornecendo-os, quando solicitados, aos sindicatos, às entidades representativas dos empregados ou aos cidadãos interessados.

O Ministério da Saúde juntamente com os Ministérios do Trabalho e Emprego e da Previdência Social, com a Política Nacional sobre Saúde e Segurança do Trabalho, objetivam a ampliação de suas ações visando à inclusão de todos os trabalhadores no sistema de promoção e proteção da saúde, a harmonização de suas normas e ações neste sentido, a reestruturação da formação em saúde do trabalhador e em segurança do trabalho e incentivo à capacitação e à educação continuada dos trabalhadores, dentre outras.

As medidas de proteção à saúde do trabalhador deveriam ser prioridade dos órgãos governamentais, bem como pelas próprias empresas privadas, pois o trabalhador, em sua grande maioria, não possui as informações mínimas sobre os riscos reais que vai encontrar no desenvolvimento de suas funções, realidade esta que pode ser atribuída a crença tanto do órgão público, quanto das empresas que não são necessários estes investimentos por acreditarem que os mesmos oneram ainda mais seus custos.

Como resultado desta deficiência, encontramos algumas doenças comuns, como surdez, originadas em ambiente de trabalho ruidoso, lesões por esforços repetitivos e as várias formas de intoxicação relacionadas à exposição a substâncias químicas, que muitas vezes poderiam ser evitadas ou minimizadas com um simples programa preventivo ou de orientação de medicina e segurança do trabalho, que somam-se a outros tipos de doenças dificilmente relacionadas ao trabalho, mas facilmente agravadas pelo labor: as “concausalidades”.

A falta de um critério justo e eficiente para a reabilitação do trabalhador acarreta prejuízo para o Poder Público e também para o empresário. Isso ocorre porque a falta de fiscalização e de um sistema de prevenção à acidentes do trabalho e doenças profissionais gera uma enorme demanda ao sistema previdenciário de trabalhadores que são vitimados por algum tipo de incapacidade laboral e pleiteiam no INSS o auxílio-doença.

Mecanismos jurídicos disponíveis para o trabalhador que após ser reabilitado pelo INSS é recusado pela empresa

Conforme evidenciamos acima, o trabalhador que é reabilitado pelo INSS na maioria dos casos não está efetivamente recuperado de sua incapacidade, assim como não está adequadamente reabilitado e capacitado para o exercício de outra atividade laboral, seja na mesma empresa, seja em outra.

Diante desse quadro gravíssimo o trabalhador apenas permanece aguardando a sua demissão, ou em alguns casos por não aguentar aquela situação vexatória acaba realizando seu pedido de desligamento da empresa. Essa situação se dá por conta das pressões psicológicas exercidas por seus superiores hierárquicos ou pelos próprios colegas de trabalho, diante de suas restrições laborais, independentemente de sua formação educacional ou profissional, bem como de toda sua experiência de trabalho, onde a falta de um destes torna ainda mais distante a possibilidade de reenquadrá-lo no mercado de trabalho.

Nesse passo o trabalhador precisa procurar o Poder Judiciário e tomar duas providências. A primeira está relacionado com a sua incapacidade laboral, pois na hipótese desse trabalhador se considerar inválido, permanentemente ou temporariamente, para exercer qualquer tipo de trabalho, deverá ingressar com ação judicial pleiteando a concessão ou o restabelecimento do benefício de auxílio-doença, bem como poderá pedir o auxílio-acidente e até mesmo a aposentadoria por invalidez.

A segunda providência que esse mesmo trabalhador pode tomar, separadamente ou concomitantemente com a primeira é ingressar com ação trabalhista contra empresa que eventualmente não tenha respeitado a estabilidade após o retorno, ou ainda não tenha recebido o trabalhador após a cessação do benefício de auxílio-doença, conforme já esclarecemos em um artigo específico sobre esse tema: Link do Artigo.

Tomando as providências mencionadas, o trabalhador poderá ter o seu benefício previdenciário por incapacidade restabelecido ou concedido, bem como poderá solucionar a questão da recusa da empresa de recebê-lo após a sua alta realizada pelo perito do INSS.

Considerações Finais

Devido a baixa qualidade do serviço de reabilitação profissional prestado pela Previdência Social aos segurados e dependentes, com objetivo de prover a reinserção do trabalhador no mercado de trabalho, o trabalhador que é submetido à essa reabilitação não tem garantida a permanência em seu atual trabalho de origem, bem como não consegue obter nova oportunidade em outra empregadora.

Embora a Previdência Social devesse proporcionar ao trabalhador todas as condições necessárias com tratamento digno e eficaz viabilizando uma recolocação no mercado de trabalho, infelizmente na prática isso não ocorre, prejudicando não apenas os trabalhadores, mas a sociedade como um todo, levando-se ainda em consideração os aspectos sociais.

Dessa forma, essa ineficiência da Previdência Social causa resultados negativos tanto para os segurados que não recebem o atendimento adequado, como para a própria Previdência, que acaba impondo este ônus aos empresários, sem qualquer fiscalização posterior, fazendo com que o trabalhador muitas vezes desqualificado seja subjugado pela sua própria incapacidade e tendo seu emprego e sua capacitação profissional, marginalizados.

Entendemos que o programa de reabilitação profissional, atualmente disponibilizado pela Previdência Social, necessita com urgência ser modernizado e reestruturado. Isso para atender às exigências das mudanças na esfera produtiva, o que representaria um enorme ganho para toda a sociedade, pois não podemos deixar a cargo exclusivo do empregador essa função, assim como também não podemos tomar com premissa que o empregado pretende burlar o sistema previdenciário para fazer jus a um beneficio permanente.

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Waldemar Ramos

Advogado, consultor e produtor de conteúdo jurídico, especialista em Direito de Família e Previdenciário.

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