Efeitos da sentença trabalhista homologatória de acordo na esfera previdenciária
Muitas vezes ao requerer um benefício previdenciário, o segurado se depara com um equívoco ou irregularidade em sua documentação. Assim, incontáveis casos chegam ao Judiciário principalmente com o tema reconhecimento de vínculo empregatício.
Em alguns casos as partes chegam a fazer um acordo, cabendo ao juiz validar este acordo para que surta efeitos jurídicos. E assim surge uma questão, quais os efeitos da sentença trabalhista homologatória de acordo na esfera previdenciária?
Porque sim, ao ser reconhecido o vínculo, surge a qualidade de segurado para o período, o que estava impedindo de ter seu benefício concedido.
Vínculo empregatício
Antes de mais nada, vamos entender o que configura vínculo empregatício.
O objeto de um contrato de trabalho é a prestação de serviço subordinado e não eventual do empregado ao empregador, diante do recebimento de salário, conforme o artigo 3º da CLT. Assim, a obrigação principal do empregador é realizar o pagamento do salário e do empregado prestar serviço. Para tanto, há elementos essenciais a serem preenchidos para a caracterização deste vínculo – todos devem ser preenchidos – quais sejam:
- Pessoalidade: O contrato de trabalho é firmado com pessoa específica;
- Onerosidade: O empregado deve prestar serviço e em contrapartida receber o salário pago pelo empregador;
- Não eventualidade: deve haver uma continuidade na prestação do serviço;
- Subordinação: O empregado possui uma dependência em relação ao empregado;
- Alteridade: Quer dizer que o empregado não assume o risco do negócio e sim, quem assume é o seu empregador.
Em relação a contribuição previdenciária, a pessoa que possui vínculo empregatício é denominada empregada, a qual possui filiação obrigatória ao RGPS, sendo de responsabilidade do empregador recolher a contribuição previdenciária.
Neste ponto, merece destaque o caso de irregularidade nas devidas contribuições, momento em que o empregado de forma alguma será prejudicado, devendo apenas comprovar, seja pelo CNIS, CTPS ou recibos de pagamento o recebimento de seu salário e vínculo ativo, sendo que o empregador que não cumpriu com seu dever tributário.
Importância do CNIS
Como visto, o CNIS – Cadastro Nacional de Informações Sociais é muito importante tanto para o direito do trabalho como previdenciário, uma vez que nele constam todas as informações relacionadas às contribuições realizadas e também todos os vínculos empregatícios, tanto com empresas privadas como com empresas públicas em regime CLT.
É também comum ser chamado de Extrato Previdenciário, por conta de constar todas informações previdenciárias, servindo de base para cálculos de benefícios.
Este documento contém as informações previdenciárias mais importantes de um segurado, como tempo de contribuição, valores recolhidos, vínculos de trabalho e históricos de acidente durante a vida contributiva.
O CNIS é muito valioso no momento de requerer um benefício previdenciário por constar a data de filiação ao INSS, salários, tempo de serviço, carência, benefícios já recebidos, forma de contribuição, sendo um documento feito pelo Governo.
De acordo com o Decreto 10.410/20 para a regularização do CNIS, a solicitação pode ser mesmo antes de requerer um benefício previdenciário, podendo ser feita a qualquer tempo. Isto é muito bom para que o segurado sempre acompanhe a regularidade das informações que constam neste e aponte o que está equivocado.
Para emitir o extrato do CNIS, basta acessar o “Meu INSS”, que possui ligação com o Gov.br.
Portanto, para fins de comprovação de tempo de serviço é um documento extremamente importante, por isso a dica é sempre manter os dados atualizados e conferir se as informações condizem com a realidade.
Sentença trabalhista homologatória de acordo
Ocorre que muitas pessoas não possuem o devido registro na CTPS e consequentemente não detém essas informações trabalhistas e previdenciárias a fim de requerer um benefício, tendo em vista que não possuem o tempo de serviço e/ou qualidade de segurado documentada.
Nestes casos, se faz necessário requerer auxílio judicial para que seja reconhecido o vínculo e devidamente contabilizado o tempo de serviço no período alegado.
Com isso, muito já se questionou quanto a este tema, tendo em vista que a Autarquia Previdenciária não considera esta decisão judicial suficiente para regularizar a documentação previdenciária. E por conta disto se questionou a legalidade deste poder do órgão de desconsiderar ou mitigar os efeitos de uma decisão judicial, em flagrante ofensa a vários princípios, e porque não dizer, da própria e esperada segurança jurídica.
O que ocorre é que muitas vezes apenas por meio da reclamatória trabalhista o vínculo empregatício é reconhecido, e por tal razão se discute sobre esta decisão ser considerada como início de prova material , conforme o artigo 55, §3º, da Lei 8.213/91, para fins de reconhecimento de tempo de contribuição na esfera previdenciária.
Um dos argumentos levantados pelo INSS é o fato de não ter participado do processo trabalhista, momento em que os efeitos da coisa julgada não poderiam alcançar o âmbito previdenciário. Todavia esse ponto já foi rebatido em razão do disposto no artigo 876, parágrafo único, da CLT:
Parágrafo único. A Justiça do Trabalho executará, de ofício, as contribuições sociais previstas na alínea a do inciso I e no inciso II do caput do art. 195 da Constituição Federal, e seus acréscimos legais, relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir e dos acordos que homologar.
Ainda, a par disso, relaciona-se o artigo 114, VIII da Constituição Federal “ Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a , e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.
Em relação a sentença trabalhista o INSS aduz que a legislação previdenciária exige o início de prova material para o reconhecimento do tempo de serviço, com a devida indicação do período trabalhado, o que nem sempre acontece na reclamatória trabalhista.
Ainda, no caso da sentença trabalhista homologatória de acordo, como ocorre o reconhecimento espontâneo do vínculo o que gera a anotação extemporânea na CTPS, não há a chamada instrução processual.
Nestes casos, há o grande risco dos acordos simulados, que servem apenas para gerar efeitos previdenciários sem que tenha havido efetivamente o vínculo. Da mesma forma, é possível que ocorra essa ausência de demais provas na própria sentença de mérito, quando não há a participação da empresa operando à revelia.
Com isso, surge a dúvida de quais os efeitos da sentença trabalhista homologatória de acordo na esfera previdenciária, tendo em vista o entendimento do INSS ao não reconhecer tal decisão.
Jurisprudência
A fim de solucionar esta problemática, a Turma Nacional de Uniformização editou a Súmula 31:
A anotação na CTPS decorrente de sentença homologatória constitui início de prova material para fins previdenciários.
Entretanto, o STJ possui o entendimento alinhado com o INSS no sentido de que a sentença trabalhista homologatória de acordo surte efeitos na esfera previdenciária quando ela for fundada em outros elementos de prova que evidenciam o trabalho exercido e o período alegado pelo segurado.
Em outras palavras, sim, seja a sentença trabalhista homologatória de acordo ou de mérito, esta servirá como início de prova material para consolidação do tempo de serviço, sendo de competência do INSS ou do Magistrado analisar os demais elementos de prova.
E claro, o entendimento é no sentido de não violar o artigo 55, §3º da Lei 8.213/91, a sentença deve ser corroborada por prova documental e não estritamente testemunhal.
Assim, para a jurisprudência, a sentença trabalhista homologatória de acordo serve como início de prova material para fins previdenciários, sendo que início de prova material se entende como aquele lastro documental, formal, indiciário, de modo a dar arrimo e suporte a algum fato a ser demonstrado, se houve instrução probatória e não apenas se limitou a sentença para homologar acordo.
Nesse sentido, há a necessidade de ser fundada em outros elementos que corroborem a sentença trabalhista. Caso a Autarquia na via administrativa ou o Magistrado na via judicial entendam que a sentença trabalhista homologatória de acordo não serve como início de prova material, deve ser oportunizado que o segurado realize a produção probatória, juntando documentos aptos a comprovar a alegação de vínculo que gere tempo de contribuição.
Considerações finais
A partir da análise jurisprudencial frente ao entendimento da Autarquia Previdenciária, foi possível concluir que a sentença trabalhista homologatória de acordo não é suficiente para que seja reconhecido o tempo de serviço e qualidade de segurado, a fim de que seja concedido o benefício.
Assim, caso o vínculo empregatício tenha sido reconhecido via processo judicial, é necessário que sejam apresentadas demais provas documentais para corroborar tal decisão judicial, afinal, no caso da sentença trabalhista homologatória de acordo, não foi realizado a instrução processual para embasar a decisão.
Deste modo, apesar da TNU possui entendimento de que é possível a sentença judicial constituir início de prova material para fins previdenciários, este entendimento deve ser complementado pelo atual entendimento do STJ no sentido de que deve haver uma corroboração com outros meios de prova.
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