Vigia Noturno tem Aposentadoria Especial Reconhecida
A presente matéria trata de um tema muito discutido na esfera judicial, o qual trataremos a partir de uma recente notícia. Esta notícia abordou uma decisão do Juizado Especial Federal da 3ª Região, que entendeu que vigia noturno tem aposentadoria especial reconhecida, sob a fundamentação que analisaremos a seguir.
Direito à aposentadoria especial
Antes de adentrarmos na notícia em si, é importante compreendermos o que é exercer atividades em condições especiais, conforme o artigo 57 da Lei 8.213/91.
A aposentadoria especial foi instituída pela Lei 3.807/1960, que propôs a contagem diferenciada de tempo de serviço prestado em condições de risco, com o objetivo de compensar os prejuízos causados à saúde e à integridade física do trabalhador.
Atualmente, para ter direito é necessário preencher os requisitos conforme a Emenda Constitucional 103/2019:
- a) idade mínima de 55 anos, 58 anos ou 60 anos de idade;
- b) preenchimento de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais para ambos sexos;
- c) tempo de efetiva exposição durante o período mínimo de 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.
A regra geral é a de 25 (vinte e cinco) anos de exposição efetiva. Os 15 (quinze) anos ocorrem no caso de trabalho exercido em condições especiais em que há a associação de agentes físicos, químicos e biológicos, em atividades permanentes no subsolo de mineração subterrânea em frente de produção. Necessário 20 (vinte anos) no caso de trabalho exercido no subsolo de mineração subterrânea afastadas das frentes de produção e no caso de exposição ao agente biológico asbestos (amianto).
Com isso, é preciso possuir 55 anos quando preenchidos 15 (quinze) anos de contribuição, 58 anos quando completados 20 (vinte) anos e 60 anos de idade quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição.
Ponto importante é a documentação apta a comprovar a atividade que é o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) documento que analisa o risco no exercício da função, o Laudo das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) que serve de base para o PPP, pois é mais específico em relação as condições de trabalho, visando sobretudo registrar os agentes nocivos à saúde ou à integridade física dos trabalhadores e, ainda, a Carteira de Trabalho por conta do registro de função e descrição das atividades. Ademais, há casos em que são feitas perícias no local de trabalho a fim de analisar o ambiente de trabalho e suas condições.
Destaca-se que até a EC 103/2019 era possível converter o tempo especial em tempo comum quando o cálculo se mostrava mais vantajoso. Ocorre que a partir da Reforma isto não é mais possível. Caso o período de tempo especial tenha sido realizado antes da Reforma, é possível a conversão, para entender mais basta clicar aqui.
Vigia Noturno tem Aposentadoria Especial Reconhecida pelo Judiciário
O Juizado Especial Federal da 3ª Região, ao apreciar o processo nº 0073069-23.2021.4.03.6301, analisou o caso de vigia noturno que aos 59 anos de idade, requereu na via administrativa aposentadoria por tempo na data de entrada do requerimento em 27.01.21, indeferido por falta de tempo de contribuição até 16.12.98 ou até a DER.
Inicialmente ponderou o magistrado que o reconhecimento de atividade especial deve seguir a legislação vigente no período. A atividade de vigilante era considerada especial por analogia a de guarda, prevista no Decreto 53.831/64. Isso perdurou até 1995, quando a Lei nº 9.032/95, abandonou o entendimento de caracterização da especialidade com base na categoria profissional, determinando a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos ou perigosos.
Contudo, como exposto pelo julgador, o Superior Tribunal de Justiça chancelou o entendimento de que a atividade de vigia era considerada especial até 28/04/1995, por analogia à função de guarda, com ou sem uso de arma de fogo. Após tal data, também é possível o reconhecimento da especialidade, desde que comprovada a periculosidade da atividade, ainda que exercida sem arma.
No caso em concreto, constava na CTPS do segurado o desempenho das funções de “vigia noturno”, “vigilante” e “guarda patrimonial“. Desta forma, foram reconhecidos os períodos de exercício da função de vigia antes de 1995 por conta da anotação na CTPS constar a função vigia. Em relação aos períodos posteriores a 1995, reconheceu apenas os períodos em que restou demonstrada a nocividade por meio de documentação ou quando especificado que portava arma de fogo, o que caracterizaria por si só a nocividade.
Em relação a documentação para comprovação, a usada no caso foram os PPP, que especificavam a atividade desempenhada, como por exemplo “trabalhar em sistema de rodízio nos diversos postos de vigilância a fim de garantir a segurança das instalações da contratante, comunicar irregularidades ao líder, controlar acesso de pessoas e fornecedores, coibir invasões e atividades suspeitas, zelo do patrimônio, efetuar rondas, obedecendo aos procedimentos do sistema de qualidade”. Diante deste documento, entendeu o magistrado que tal descrição restou suficiente para demonstrar a permanente exposição do autor à atividade nociva que colocasse em risco sua integridade física.
Ao realizar a contagem, restou computado apenas 19 anos 3 meses e 22 dias de atividade especial, sendo que no caso o mínimo seria de 25 anos de efetiva exposição. Assim, reconheceu a especialidade a fim de averbar tais períodos não computados pelo INSS, a serem convertidos em tempo comum, concedendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Por fim, foi concedida a tutela antecipada determinando ao INSS conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, em razão do preenchimento do requisito da probabilidade do direito, tendo em vista a análise jurisdicional que resultou no reconhecimento da atividade especial e na concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, bem como o perigo de dano por conta da natureza alimentar dos benefícios previdenciários.
Especialidade da função de vigia
Como visto na decisão, o fundamento foi que a função de vigia quando comprovada a exposição do trabalhador à atividade nociva, conforme entendimento do STJ é caso de reconhecimento de atividade especial.
Pois bem, inicialmente o INSS não entendia que no exercício da profissão de vigia estaria presente a nocividade. Contudo, em 2012 surgiu o Tema 534 do STJ com orientação no sentido de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivas são exemplificativas, assim, caso haja caso distinto do ali arrolado e comprovada a exposição, de forma permanente, não ocasional, nem intermitente, é possível reconhecer a especialidade da atividade.
Após esse entendimento, a dúvida que surgiu foi quanto o uso ou não de arma de fogo para a caracterização de atividade especial. Com isso a jurisprudência muito discutiu se este fato interferiria na especialidade.
A fim de pacificar o entendimento, o STJ novamente se manifestou quanto ao tema. Assim, por unanimidade entendeu que sim, deve ser considerada a atividade de vigia, segurança pessoal ou patrimonial como especial, quando comprovado o exercício da função em condições especiais.
Quanto a comprovação, esta até 05 de março de 1997 deve ser comprovada por qualquer meio e após tal ano por laudo técnico ou elemento material equivalente. Para finalizar, entendeu que não deve ser critério o uso da arma de fogo ou não para o reconhecimento da especialidade, o que resultou no Tema repetitivo 1031.
Ainda, a Turma Nacional de Uniformização está julgando está mesma questão, que irá resultar no Representativo de controvérsia, Tema 282.
Considerações finais
Como visto acima, por muito tempo a atividade exercida pelo vigia noturno não foi considerada nociva, consequentemente não gerando direito à aposentadoria especial. Após ser reconhecida sua nocividade, surgiu nova questão, se o uso de arma de fogo seria critério fundamental para a caracterização da especialidade da atividade.
Assim, diante da análise da notícia quanto a uma decisão do Juizado Especial Federal da 3ª Região que reconheceu a aposentadoria especial ao vigia noturno, foi possível compreender a aplicação do entendimento pacificado pelo STJ quanto a especialidade da atividade desempenhada pelo vigia. Esta independe do uso de arma de fogo, momento em que deve ser comprovada a nocividade por meio de documentação técnica, em especial o PPP, que é o documento oficial para comprovação das condições das atividades desempenhadas e do ambiente de trabalho.