Saiba como obter o início de prova material para concessão de benefício no INSS
A busca pela concessão da aposentadoria ou de qualquer benefício previdenciário junto ao INSS que exija tempo de contribuição e carência, começa pela organização dos documentos que prove o tempo trabalhado ou contribuído e quando as informações não constam no sistema do INSS é indispensável realizar um ajuste no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, apresentando início de prova material do período a ser regularizado, conforme estabelece o artigo 55, § 3º da lei 8.213/91.
A previsão legal para a retificação do CNIS para a inclusão de período de contribuição esta no artigo 108 da lei 8.213/91. Quando o INSS nega a inclusão de algum período contributivo ou de vínculo, é preciso ingressar com procedimento judicial para que seja feito o referido ajusto do período não constante no CNIS.
Vamos explicar, a seguir, todo o assunto relacionado ao início de prova material para concessão de benefício no INSS.
O que é início de prova material? Quando usar?
O “início de prova material” significa apresentar algum documento contemporâneo, isto é, relacionado à época em que se pretende provar ou averbar um vínculo ou contribuição no INSS, para que esse período seja considerado no tempo de contribuição para concessão do benefício.
Atualmente a prova documental, chamado de prova material, é indispensável para provar algum período pelo qual o segurado pretende incluir no seu tempo contributivo, pois a legislação previdenciária, ao longo dos últimos anos endureceu muito os critérios de acesso aos benefícios e passou a exigir mais provas para o reconhecimento de algum período contributivo ou de vínculo empregatício.
Isso dificultou muito os segurados especiais (trabalhadores ruais) que são pessoas simples e não se preocupam em guardar documentos para fazer prova no futuro do exercício de sua atividade, levando, tal situação, ao indeferimento do benefício requerido.
Valor da prova documental e da prova testemunhal para o INSS
O serviço público de modo geral está muito baseado em protocolos de procedimento formal. Basicamente, existem normas internas que são seguidas à risca para “executar” na Administração o que a lei ou a Constituição Federal determinaram de modo geral para todos.
Um processo administrativo, um parecer de análise, uma resposta para cada caso é o que traz ao “mundo concreto” aquilo que a abstração das leis deseja, mas como tudo é uma questão de interpretação, o INSS cumpre seu papel institucional interpretando e executando essas abstrações da lei do ponto de vista mais favorável para ele, assim como os segurados procuram interpretar também as relações previdenciárias de um modo mais favorável para si.
Toda interpretação precisa de argumentos para fazer constar ou para rebater aquilo que cada um traz como juridicamente importante, e o sistema de provas é exatamente o que separa a simples interpretação da argumentação jurídica. Para compor esse “jogo” e formar um processo válido, algumas regras foram estabelecidas para fortalecer a credibilidade das alegações e trazer mais segurança jurídica para os cidadãos e para o Direito como um todo.
Proibir concessões de benefício exclusivamente embasadas por testemunha é uma das regras atuais em tema Previdenciário, algo que já vinha ocorrendo mesmo antes da última reforma da Previdência.
Neste contexto, o valor da prova testemunhal é complementar, enquanto o valor da prova documental é completo, mas cuidado! Apesar de completa a documentação não é plena, bastando seu “início” para deflagrar seus efeitos, isso porque a testemunha não dispensa o documento, mas o documento pode dispensar ou não a testemunha, veja só uma decisão judicial sobre o tema:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. BOIA-FRIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. PREENCHIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. […] 2. O trabalhador rural que preencher os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei nº 8.213/91, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade. 3. Caso em que comprovados o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício. 4. Considera-se demonstrado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício.
(TRF4 5059647-66.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 13/03/2019).”
Exemplos de situações
Qualquer necessidade de prova de fato ou de circunstância do segurado e/ou de dependente previdenciário, seja relacionado a fato, documento ou condição para benefício, pode ser justificada com o início de prova documental. Isso se aplica para diversas situações:
- Prova de dependência econômica: alguns dependentes precisam provar dependência econômica também, por isso, qualquer “rastro” desta característica deve ser buscado, como declarações de imposto de renda, comprovantes de pensão alimentícia, inscrição em plano de saúde como dependente, etc.;
- Prova de união estável: para o INSS os parceiros não precisam ser casados, mas é preciso demonstrar no mínimo a existência de união estável, ainda que não formalizada. Isso é possível quando o dependente consegue provar que vivia uma relação pública, duradoura e estável, independentemente de coabitação ou da existência de filhos comuns;
- Vínculos e contribuições: é muito comum que o CNIS do segurado precise ser atualizado ou corrigido para gerar benefícios mais fiéis à realidade da pessoa. Para tanto, o segurado deve confrontá-lo com a CTPS, contratos de prestação de serviço, prints do empregador, entre outras possibilidades de documento escrito;
- Atividade rural ou autônoma: alguns segurados possuem presunção de recolhimento, isso significa que a prova da atividade é suficiente para caracterizar o cômputo do período, ainda assim, deve ser feita com o início de prova documental.
É possível obter um benefício previdenciário só com prova testemunhal?
Com as diversas modificações na legislação previdenciária, o acesso aos benefícios estão cada vez mais restrito e a aceitação da prova unicamente testemunhal tem sido cada vez mais prejudicada no âmbito judicial.
Por outro lado, não existe rigor nas provas documentais que acuse uma forma única ou fechada de fazer prova, pois como já foi dito antes, qualquer meio de ligação entre o que se fala e o que precisa ser provado é válido e ajuda na comprovação, desde que ela tenha conexão lógica com o momento que se quer provar.
Com o decreto 10.410 de 2020, o artigo 16 do regulamento geral da Previdência trouxe a seguinte redação:
Art. 16, § 6º-A: “As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior aos vinte e quatro meses anteriores à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, observado o disposto no § 2º do art. 143.”
Como é muito importante identificar alguns direitos no momento do requerimento ou no momento do óbito, como é o caso da pensão por morte, documentos muito antigos podem não provar a atualidade do direito em algumas situações, como o estado de casado do cônjuge ou a permanência da incapacidade para os filhos maiores de 21 anos.
Outro problema é identificar ao certo o que pode ser configurado como motivo de força maior ou caso fortuito e adaptar o conceito aos acontecimentos e imprevistos atuais para permitir prova exclusiva de testemunha. O mais próximo desta definição está na instrução normativa número 77 de 2015, no artigo 577:
“Art. 577. Tratando-se de Justificação administrativa (comprovação previdenciária no INSS) para prova de tempo de serviço ou de contribuição, será dispensado o início de prova material quando houver impossibilidade de apresentação por motivo de força maior ou caso fortuito, tais como incêndio, inundação ou desmoronamento, que tenha atingido a empresa na qual o segurado alegue ter trabalhado, devendo ser observada a correlação entre a atividade da empresa e a profissão do segurado.
§ 1º A comprovação dos motivos referidos no caput será realizada com a apresentação do registro no órgão competente, feito em época própria, ou mediante elementos de convicção contemporâneos aos fatos.
§ 2º No registro da ocorrência policial, da certidão do Corpo de Bombeiros, da Defesa Civil, ou de outro órgão público competente para emitir certidão sobre o evento, deverá constar a identificação da empresa atingida e a extensão dos danos causados.”
Início de prova material na Justiça
Sem o início de prova material para instruir a causa, o juiz termina o processo sem analisar a justiça do pedido, isto é, ele encerra a discussão sem resolvê-la por faltar sustento probatório no processo, ainda que existam muitas testemunhas para o que será tratado, veja só:
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BOIA-FRIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
[…] 2. Inexistência nos autos de início de prova material hábil a comprovar o exercício da atividade laborativa rurícola na condição de segurada especial do instituidor da pensão.
3. A ausência de conteúdo probatório válido a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito. Dessa forma, possibilita-se que a parte autora ajuíze nova ação, caso obtenha prova material hábil a demonstrar o exercício do labor rural durante o período de carência necessário para a concessão da aposentadoria pleiteada. (TRF4, AC 5026766-02.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 11/04/2019)”.
Apesar do início de prova material ser indispensável, o Poder Judiciário não ignora algumas irregularidades documentais causadas por obstáculos variados, como condição socioeconômica do segurado, acesso à informação e educação formal ou idade, por isso, o Poder Judiciário aceita as provas indiretas (em nome de terceiros, desde que possível a ligação com o interessado) e de forma livre, utilizando os documentos trazidos pela norma apenas como exemplos ou guias e não como regras absolutas.
Trabalhador rural e regularidade documental
O caso do trabalhador rural sempre foi mais sensível em matéria de documentação, isso porque em razão de questões socioestruturais a dificuldade documental sempre foi uma realidade, veja, por exemplo, uma explicação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região em 2019:
“Não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral (testemunhal), possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, valem como início de prova material do trabalho rural. Com efeito, como o §1º do artigo 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem em condições de mútua dependência e colaboração. Nesse sentido, a propósito, a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região diz que ‘admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental’”. (TRF4 5059647-66.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 13/03/2019)
Na falta de documentos em nome próprio ou de terceiros relacionáveis, o segurado deve buscar uma declaração do empregador (se for o caso) ou/e do sindicato ruralista, pelo menos para suprir a necessidade deste início de prova material, uma vez que o INSS está em processo cada vez mais rigoroso de negar apenas testemunhas e/ou declarações de próprio punho do segurado (conforme artigo 19-D, § § 10 e 11 do decreto 3.048/99).
Toda a documentação deve guardar coerência temporal, ou seja, dizer respeito ao período que se pretende comprovar, o que não necessariamente significa cobrir por completo e ano a ano toda a extensão de tempo.
Por exemplo, se Josefina foi trabalhadora rural entre 1989 e 2000, mas conseguiu documentos de 1989 a 1995 e depois de 1998 em diante, já seria o bastante para início de prova material, por isso o “buraco” de contribuição que ela tem pode ser suplementado por testemunhas sem maiores problemas.
As declarações do próprio segurado dadas num processo judicial são consideradas prova equivalente ao depoimento testemunhal, e, que por isso, requer também evidência escrita que prove a situação do depoimento (TRF4 5034389-25.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 27/02/2019).
Lembrando a você de que a partir de primeiro de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade rural do segurado especial (rural em regime familiar) ocorrerá, exclusivamente, por meio das informações constantes do cadastro CNIS, cuja atualização será de extrema importância para a garantia dos benefícios previdenciários no futuro (artigo 19-D, § 9º do decreto 3.048/99).
Notas conclusivas
Agora você já sabe que qualquer “papel” com conteúdo escrito e desde que relacionado com o período ou atividade que se pretende provar, tem a possibilidade de servir como início de prova material e só o início é suficiente porque a prova testemunhal pode complementar o documento incompleto apresentado.
Nem todo documento precisa estar no nome do segurado, um registro rural imobiliário em nome da ex-esposa, por exemplo, pode ajudar a associar o segurado com o imóvel pela certidão de casamento, por isso é importante que o segurado e/ou o dependente previdenciário sejam criativos na hora de fazer valer os seus direitos.
Como o Poder Judiciário tem mais flexibilidade para analisar e conceder benefícios, muitas vezes judicializar é o caminho mais indicado, por isso não deixe de consultar um advogado especializado antes de tomar qualquer decisão que afete o seu futuro.
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