Saiba tudo sobre a Aposentadoria Híbrida: Urbana + Rural
Com a Reforma da Previdência, que foi aprovada em 2019, as regras para obter o benefício da aposentadoria mudaram, o que causou incerteza e insegurança para os trabalhadores em geral. Porém, uma categoria em particular encontra ainda mais dúvidas: a dos trabalhadores que pretendem receber o benefício da Aposentadoria Híbrida.
Infelizmente, a falta de informação clara sobre o assunto impede que essas dúvidas sejam resolvidas. Aliás, muitos brasileiros nem sabem que essa modalidade de benefício existe. Por isso, criamos um artigo que apresenta todos os aspectos básicos da Aposentadoria Híbrida: quem tem direito a ela, os critérios para concessão, as características do benefício.
Essas informações são extremamente importantes, já que a Previdência Social e, particularmente, o benefício da aposentadoria, são a garantia de sustento para o trabalhador que, por idade ou outro motivo, já não pode trabalhar. Você pode precisar desse benefício a qualquer momento; então, prepare-se desde já, aprendendo mais sobre a Aposentadoria Híbrida.
O que é Aposentadoria Híbrida
Aposentadoria híbrida, também chamada de aposentadoria por idade híbrida ou aposentadoria mista, é uma modalidade em que o trabalhador pode se aposentar por idade, desde que ele atinja um tempo mínimo de contribuição (bastante inferior ao que é exigido nas aposentadorias por tempo de contribuição). O detalhe é que, para atingir esse mínimo, ele pode somar seu tempo de contribuição com o INSS nas modalidades urbana e rural.
Quem depende da aposentadoria híbrida são principalmente aqueles brasileiros que, ao longo da vida, migram das zonas rurais para os centros urbanos do país, em busca de melhores condições de vida. Nessa migração, eles deixam o trabalho no campo por empregos na indústria, no comércio ou no setor de serviços. Então, essa modalidade de benefício garante que eles não precisem “jogar fora” o tempo de contribuição para o INSS que já foi acumulado.
Sem a possibilidade de fazer essa combinação, alguns trabalhadores não conseguiriam se aposentar, pois o seu tempo de contribuição nas modalidades urbana e rural, considerado individualmente, não seria suficiente para ter direito ao benefício.
Como surgiu a Aposentadoria Híbrida
A aposentadoria híbrida é uma criação relativamente recente do Direito brasileiro. Ela surgiu com a Lei 11.718 de 2008, que alterou o artigo 48 da Lei da Previdência Social (Lei 8.213 de 1991).
Para entender a aposentadoria híbrida, é preciso dar uma olhada no artigo 48 da Lei da Previdência Social. Para começar, você precisa saber que o assunto principal deste artigo é a regra da aposentadoria por idade; e que a aposentadoria híbrida está vinculada a esse assunto. Pode parecer um detalhe pouco importante agora, mas fará diferença depois.
O artigo estabelece que, desde que seja cumprido um “período de carência”, o trabalhador urbano pode se aposentar por idade aos 65 anos, se for homem, ou aos 60 anos, se for mulher. No caso de trabalhadores rurais, a idade cai para 60 anos, se for homem, e 55 anos, se for mulher.
Esse período de carência é um mínimo de contribuições mensais ao INSS que o trabalhador precisa fazer ao longo da vida. De acordo com o artigo 25, II, da Lei 8.213, para ter direito à aposentadoria por idade, a carência é de 180 contribuições mensais (o equivalente a 15 anos de contribuição).
Então, a Lei 11.718 de 2008 trouxe suas mudanças para o artigo. Ela determinou que, para que um trabalhador rural possa se aposentar com essas idades menores, ele precisa comprovar que realmente estava trabalhando no campo logo antes de entrar com o requerimento do benefício.
Além disso, o trabalhador precisa comprovar que trabalhou no campo, no mínimo, pelo mesmo número de meses que a carência exigida para o benefício, mesmo que não tenha sido por um período contínuo. Ou seja, ele precisa provar que trabalhou no campo por, no mínimo, 15 anos.
A Lei 11.718 de 2008 também criou uma solução para os casos em que o trabalhador não conseguir cumprir esses requisitos com base apenas no seu tempo de trabalho e contribuição na modalidade rural, mas puder cumpri-los com a combinação do tempo de trabalho e contribuição na modalidade urbana.
Nesses casos, ele tem direito à aposentadoria por idade. Porém, existe um detalhe: as idades mínimas voltam a ser de 65 anos, para homens, e 60 anos, para mulheres.
Resumindo tudo: a Lei 11.718 fez algumas mudanças na Lei da Previdência Social e criou a aposentadoria híbrida, uma modalidade que permite combinar os tempos de trabalho e contribuição nas modalidades rural e urbana. O trabalhador que pretende obter o benefício da aposentadoria híbrida precisaria ter 15 anos de contribuição e 65 anos de idade, se for homem, ou 60 anos de idade, se for mulher. O tempo de contribuição é combinado entre o trabalho no campo e os empregos na indústria, comércio ou setor de serviços.
No entanto, essa explicação só mostra como a aposentadoria híbrida surgiu, como ela funcionava quando foi criada, há mais de uma década. Desde então, ela já foi modificada pela Reforma da Previdência.
Como a Reforma da Previdência afetou a Aposentadoria Híbrida
Em 2019, o governo conseguiu aprovar no Congresso a Emenda Constitucional n° 103, que mudou aspectos importantes da Constituição e legislação brasileira sobre Previdência Social.
Essa reforma foi motivada pelo rombo financeiro na Previdência; estudos econômicos mostravam que, sem algumas mudanças, não haveria recursos suficientes para pagar os benefícios de todos os brasileiros que dependem do INSS. Para tentar amenizar o rombo, a EC 103 modificou, entre outras coisas, as regras da aposentadoria por idade.
Você deve se lembrar que, na Lei da Previdência Social, a aposentadoria híbrida está vinculada à aposentadoria por idade. Portanto, a mudança nas regras da aposentadoria por idade, no entendimento da maioria dos especialistas, também se aplica à modalidade de aposentadoria híbrida.
Os 15 anos de contribuição para o INSS permanecem inalterados, bem como a idade mínima para homens, que continua sendo de 65 anos. No entanto, a idade mínima para mulheres aumentou para 62 anos.
Essa alteração não será implementada imediatamente. Em vez disso, foi criada uma regra de transição. A cada ano, a partir de 2020, a idade mínima para mulheres aumenta em 6 meses. Portanto, temos o seguinte esquema:
- No ano de 2020, as mulheres precisam ter 60 anos e 6 meses de idade mínima para requerer a aposentadoria híbrida;
- No ano de 2021, elas precisam ter 61 anos de idade mínima;
- No ano de 2022, elas precisam ter 61 anos e 6 meses de idade mínima;
- A partir do ano de 2023, elas precisam ter 62 anos de idade mínima.
Tema 1104 do STF sobre a Aposentadoria Híbrida
Saber o que fala a lei é importante, mas você também precisa estar atento ao que falam os Tribunais, diante dos processos ligados à aposentadoria híbrida. As decisões e os pareceres do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, direcionam como a legislação deve ser interpretada.
Um exemplo disso é o posicionamento do STF em relação a um recurso que foi apresentado pelo próprio INSS (RE 1281909). Vamos entender bem a questão.
O entendimento do STJ é de que o tempo de trabalho no campo anterior a 1991 (quando a Lei de Previdência Social entrou em vigor, com as regras do artigo 48, que já vimos) poderia ser considerado para atingir aqueles 15 anos de contribuição que a aposentadoria híbrida exige, mesmo que o trabalhador não tivesse vínculo em Carteira de Trabalho, nem efetivamente recolhido as contribuições para o INSS durante esse período. Esse tempo de trabalho no campo antes de 1991 precisa ser comprovado, mas isso pode ser feito por outras formas.
O STJ também entende que o trabalhador não precisa ter exercido o trabalho no campo imediatamente antes de requerer o benefício da aposentadoria híbrida. Em vez disso, ele pode ter cumprido esse tempo de trabalho a qualquer momento ao longo de sua vida.
O INSS, por sua vez, queria contestar esse entendimento. Sua tese era de que o trabalhador só usar o tempo de trabalho no campo antes de 1991 para completar o tempo necessário para a aposentadoria híbrida se pudesse comprová-lo pelo recolhimento das contribuições.
Outro ponto de discordância do INSS era em relação ao fato de que o trabalhador precisaria ter cumprido 15 anos de trabalho rural logo antes de entrar com a requisição da aposentadoria híbrida.
Perceba que essa tese vai justamente na direção contrária do motivo pelo qual existe a aposentadoria híbrida: permitir que pessoas que começaram a vida trabalhando no campo e, depois, migraram para a cidade, consigam se aposentar. Essas pessoas não trabalham no campo logo antes de pedir a aposentadoria.
O STJ não aceitou a tese do INSS, pois afirmou que, além de não ter base legal, ela contraria o objetivo da própria legislação – que é viabilizar o acesso à aposentadoria para trabalhadores que não conseguem atingir os critérios mais rígidos.
O STJ ainda apontou que a tese do INSS torna a previsão da aposentadoria híbrida praticamente inútil. Afinal, se o trabalhador consegue cumprir 15 anos no exercício de trabalho rural, esse tempo é suficiente para se aposentar por idade, sem precisar combiná-lo com o tempo de trabalho na modalidade urbana.
Então, o INSS levou a questão para o STF, gerando o Tema 1104.
No STF, a maioria dos ministros entendeu que a questão não devia ser discutida ali, pois o Supremo só analisa questões de constitucionalidade. O recurso diz respeito à chamada “legislação infraconstitucional”, isto é, leis que estão abaixo da Constituição – no caso, a Lei de Previdência Social. Portanto, o entendimento do STJ continuou valendo.
Como o Decreto 10.410 afetou a Aposentadoria Híbrida
Em junho de 2020, o Decreto 10.410 resolveu, ao menos em parte, a questão por trás desse recurso. Esse Decreto foi criado para atualizar outro, mais antigo: o Decreto 3.049 de 1999, que traz o Regulamento da Previdência Social.
O novo decreto alterou o artigo 57 do antigo, estabelecendo que o trabalhador tem direito à aposentadoria híbrida mesmo que, no momento do requerimento, ele não esteja exercendo o trabalho rural.
Com isso, aquela tese do INSS que vimos no item anterior, de que o trabalhador precisaria ter cumprido 15 anos de trabalho rural logo antes de requerer o benefício, caiu definitivamente. Ela já não tinha muito apoio nas decisões dos Tribunais, mas agora não há mais qualquer espaço para disputas na Justiça quanto a isso.
Outros exemplos de Decisões Judiciais sobre Aposentadoria Híbrida
Vejamos mais alguns exemplos de como os tribunais estão decidindo em relação à aposentadoria híbrida.
Em um recurso apresentado ao TRF-3, a decisão foi de que não é preciso que a atividade predominante do trabalhador tenha sido rural, nem que ela tenha sido a última exercida quando ele entrou com requerimento do benefício. O tribunal também decidiu que é possível usar testemunhas para comprovar o tempo de trabalho rural, mas que é necessário ter, pelo menos, um início de prova material, que pode ser feita através de vários documentos. (Apelação Cível AP 0004099-37.2018.4.03.9999 SP)
Neste artigo, você teve a oportunidade de conhecer a modalidade de aposentadoria híbrida, que permite combinar o tempo de contribuição no trabalho rural e urbano para atingir o período de carência e obter o benefício da aposentadoria por idade.
Se você, ou algum de seus conhecidos, já trabalhou no campo, é importante buscar o aconselhamento de um escritório de advocacia especializado em Direito Previdenciário. Apenas um advogado pode analisar o caso e avaliar se existem chances de obter o benefício da aposentadoria híbrida.
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