Pensão por Morte

A possibilidade de acumular pensão por morte com outros benefícios e a Reforma da Previdência

Os benefícios da Previdência Social são fundamentais para que milhares de brasileiros possam viver com dignidade. Por isso, a possibilidade de ter que abrir mão desses benefícios causa muita preocupação. Isso leva a questões como: uma pessoa pode acumular pensão por morte com outros benefícios?

Essa é a questão que vamos responder no artigo de hoje. Você vai descobrir se é possível acumular o benefício de pensão por morte com auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por idade ou tempo de contribuição, aposentadoria por invalidez e até mesmo com outra pensão por morte.

Além disso, também vamos explorar um pouco a Reforma da Previdência e como ela afetou a possibilidade de acumular benefícios previdenciários. Então, acompanhe esse artigo até o final para descobrir se você precisa – ou não – abrir mão de algum benefício.

Proibições de acumulação de benefícios previdenciários

Para descobrir se é possível acumular pensão por morte com outros benefícios, o primeiro caso é analisar as situações em que a legislação expressamente proíbe a acumulação de benefícios. 

Essas situações estão previstas no artigo 124 da Lei 8.213/91, que trata dos planos de benefícios da Previdência Social. Veja o que diz esse artigo:

Art. 124. Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social:

I – aposentadoria e auxílio-doença;

II – mais de uma aposentadoria;

III – aposentadoria e abono de permanência em serviço;

IV – salário-maternidade e auxílio-doença;

V – mais de um auxílio-acidente;

VI – mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa.

Parágrafo único. É vedado o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente. 

Em resumo, só existe uma proibição expressa na legislação contra acumular pensão por morte com outros benefícios. Não é possível acumular duas pensões por morte de cônjuges ou companheiros.

Mesmo assim, a lei ainda preserva o direito de opção pela pensão mais vantajosa. Imagine que uma pessoa que já recebe pensão por morte de cônjuge ou companheiro volta a se casar, ou entrar em uma relação estável, e o novo cônjuge ou companheiro falece. Nesse caso, ela poderá escolher a pensão de maior valor, deixando de receber a outra.

Já houve várias tentativas de flexibilizar essa proibição na Justiça. Os argumentos, em geral, apontam a necessidade financeira do beneficiário. No entanto, o Poder Judiciário sempre demonstrou um entendimento pacificado a favor da legislação nesse caso.

Agora, a proibição está ainda mais forte, já que a Reforma da Previdência retomou esse ponto. No artigo 24 da EC 103/2019, temos o seguinte texto:

Art. 24. É vedada a acumulação de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro, no âmbito do mesmo regime de previdência social, ressalvadas as pensões do mesmo instituidor decorrentes do exercício de cargos acumuláveis na forma do art. 37 da Constituição Federal.

Ao mesmo tempo que esse artigo reforça a proibição de acumular pensões por morte deixada por cônjuges ou companheiros, ela também cria duas exceções. 

A primeira exceção se aplica às situações em que os benefícios tenham origem de regimes previdenciários diferentes.

Imagine que uma mulher recebe pensão por morte do primeiro marido, vinculada ao Regime Geral de Previdência Social. Ela se casa novamente e o segundo marido vem a falecer, deixando uma pensão por morte vinculada ao Regime Próprio Estatutário. Nesse cenário, ela pode acumular as duas pensões, porque a fonte de custeio dos benefícios é diferente.

Essa exceção não estava clara na legislação antes da EC 103/2019, mas já existia uma jurisprudência estabelecendo o entendimento a favor dessa possibilidade. 

O Superior Tribunal de Justiça – STJ, no julgamento de um Recurso Especial em 2011, apontou que “não há vedação legal que obste o recebimento de percepção cumulada quando se trata de regimes de previdência distintos”. (REsp 1242108/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/10/2011, DJe 13/10/2011)

A segunda exceção se aplica ao caso em que um único segurado falecido deixe mais de uma pensão por morte. Isso pode acontecer, caso o cônjuge ou companheiro trabalhe no exercício de cargos específicos previstos no artigo 37, XVI, da Constituição.

Esses são cargos públicos em que a própria Constituição autoriza o acúmulo de remunerações. Portanto, ao autorizar também o acúmulo da pensão por morte, a EC 103/2019 está apenas estendendo o direito constitucional aos dependentes do trabalhador.

Acumular pensão por morte com outros benefícios

acumular pensão por morte
A possibilidade de acumular pensão por morte com outros benefícios e a Reforma da Previdência 4

Considerando a leitura do artigo 124 da Lei 8.213/91, podemos afirmar que, além do acúmulo de duas pensões por morte do cônjuge, não existe nenhuma outra proibição. 

Em outras palavras, seria possível acumular a pensão por morte com qualquer outro benefício da previdência social, como aposentadoria por invalidez, aposentadoria por tempo ou idade, auxílio-doença, salário maternidade, auxílio-reclusão e auxílio-acidente.

De fato, seria possível acumular até mesmo com uma segunda pensão por morte, desde que não sejam ambas relativas a vínculo de casamento ou união estável. Assim, o recebimento de uma pensão por morte do cônjuge pode ser acumulada com uma pensão por morte do filho, por exemplo.

Já existem, inclusive, decisões judiciais demonstrando esse entendimento. No julgamento de um recurso, o Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro apontou que “inexiste qualquer impedimento legal à cumulação de benefício de pensão por morte de marido e de filho”, destacando que “ambos possuem fatos geradores distintos”. (TRF-2 – AGTREO: 394540 RJ 2006.51.17.002132-4)

Também é importante notar que a lei só proíbe acumular duas pensões por morte com o mesmo fato gerador quando esse fato é o vínculo de casamento ou união estável. Por isso, se o fato gerador for outro, o acúmulo também é possível.

Assim, é possível acumular duas pensões por morte deixadas por filhos diferentes. Imagine uma mãe que tenha dois filhos e seja dependente economicamente de ambos. Se os dois filhos, segurados da Previdência Social, vierem a falecer, essa mãe poderá acumular os dois benefícios de pensão por morte.

Esses são os apontamentos gerais sobre a possibilidade de acumular pensão por morte com outros benefícios. Nos próximos tópicos, você vai ver alguns casos específicos com aspectos mais controversos.

Pensão por morte acumulada com benefício assistencial de prestação continuada – LOAS

O benefício assistencial de prestação continuada, conhecido como LOAS, está previsto no artigo 203, inciso V da Constituição Federal. A sigla LOAS refere-se, na verdade, à lei que regulamenta o benefício: a Lei Orgânica da Assistência Social, ou Lei 8.742/93.

Esse benefício está descrito na Constituição da seguinte forma:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Na Lei 8.742 (art. 20), os beneficiários são especificados com mais detalhes. São pessoas com deficiência e idosos com 65 anos ou mais que comprovem não ter meios de se sustentar, nem família para prover o seu sustento.

Então, a questão é se esse benefício pode ser acumulado com pensão por morte; e a resposta é não. A própria Lei 8.742 (art. 20, §4º) estabelece proibição de acumular o LOAS com qualquer outro benefício da Previdência Social ou de outro regime, salvo apenas duas exceções – que não incluem a pensão por morte.

Para entender o motivo, basta notar que o critério para receber o LOAS é a falta de quaisquer meios de sustento. Ele é voltado para as pessoas em condição de maior vulnerabilidade financeira. O indivíduo que recebe uma pensão por morte, ele já tem ao menos esse meio para se sustentar. Logo, ele não poderá se enquadrar no critério para ser beneficiário do LOAS sem abrir mão da pensão por morte.

Esse já é um entendimento presente nas decisões judiciais. O TRF-4, ao julgar um recurso, apontou que “é vedado o recebimento conjunto de benefício assistencial e pensão por morte, consoante previsão legal inserta no artigo 20, parágrafo 4º, da Lei 8.742-93”. (TRF-4 – APL 5069617-90.2017.4.04.9999)

Pensão por morte acumulada com aposentadoria do segurado especial (trabalhador rural)

Devido a mudanças anteriores na legislação, durante alguns anos persistiram dúvidas sobre a possibilidade de acumular a pensão por morte com aposentadoria do segurado especial ou trabalhador rural.

Porém, quando a Lei 8.213/91 estabeleceu as proibições de acúmulo de benefícios previdenciários no seu artigo 124, ela não fez distinção entre a aposentadoria urbana e rural. E, como já vimos, esse artigo não inclui nenhuma proibição de acúmulo de aposentadoria com pensão por morte.

Portanto, sim, é possível acumular a pensão por morte com aposentadoria rural. 

Inclusive, esse entendimento já foi consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ. Em um julgamento de 2013, por exemplo, o Tribunal apontou que “nos termos da jurisprudência do STJ, a lei previdenciária não impede a cumulação dos proventos de aposentadoria com a pensão por morte”. (AGRESP 201303863543)

O argumento para essa decisão é que os benefícios apresentam naturezas e fatos geradores diferentes. Enquanto a aposentadoria rural é um benefício destinado ao segurado pelo tempo de trabalho, a pensão por morte é um benefício destinado aos dependentes para compensar a perda do provedor financeiro.

Pensão por morte acumulada com seguro desemprego

Photo portrait of an old woman in a park on a warm day
A possibilidade de acumular pensão por morte com outros benefícios e a Reforma da Previdência 5

seguro desemprego é um benefício temporário. Com ele, o trabalhador segurado desempregado recebe valores mensais durante um certo período, com a finalidade de manter o sustento próprio e de sua família enquanto não é admitido novamente no mercado de trabalho.

Para analisar a possibilidade de acumular pensão por morte com seguro desemprego, basta olhar para o parágrafo único do artigo 124 da Lei Lei 8.213/91, o mesmo que traz as proibições de acumulação. Vamos relembrar:

Art. 124. Parágrafo único. É vedado o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente. 

Claramente, esse texto já coloca a pensão por morte como uma exceção na proibição de acumular seguro desemprego com benefícios de prestação continuada da Previdência Social.

Portanto, embora o seguro desemprego não possa ser acumulado com outros benefícios previdenciários contínuos, o acúmulo com pensão por morte é permitido pela legislação.

Reforma da Previdência e acúmulo de benefícios

Até aqui, você viu quando é possível acumular pensão por morte e outros benefícios. Porém, é importante observar que a Reforma da Previdência, a EC 103/2019, trouxe algumas alterações em relação a como funciona o acúmulo.

A nova regra se aplica aos casos especificamente previstos na Reforma, no artigo 24, §1º:

  • acúmulo de duas pensões por morte do cônjuge ou companheiro vinculadas a regimes de previdência social diferentes;
  • acúmulo de pensão por morte do cônjuge ou companheiro com pensões decorrentes de atividades militares;
  • acúmulo de pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro com aposentadoria concedida no âmbito do Regime Geral de Previdência Social ou de regime próprio de previdência social;
  • acúmulo de pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro com proventos de inatividade decorrentes de atividades militares;
  • acúmulo de pensões decorrentes de atividades militares com aposentadoria concedida no âmbito do Regime Geral de Previdência Social ou de regime próprio de previdência social.

Entre essas hipóteses, a mais relevante é o acúmulo de pensão por morte com aposentadoria. Porém, a regra é a mesma para todas elas.

Segundo a regra da Reforma (art. 24, §2º), embora o acúmulo desses benefícios seja possível, você não receberá mais os valores integrais de ambos. Em vez disso, será necessário escolher o benefício mais vantajoso para receber integralmente, enquanto o outro será pago apenas parcialmente.

A parte do segundo benefício que será paga depende do seu valor integral.

  • Se o valor integral do benefício fica entre 1 e 2 salários-mínimos, você receberá 60%
  • Se o valor integral fica entre 2 e 3 salários-mínimos, você receberá 40%
  • Se o valor integral fica entre 3 e 4 salários-mínimos, você receberá 20%
  • Se o valor integral fica acima de 4 salários-mínimos, você receberá 10%

Assim, nesses casos, a Reforma da Previdência trouxe uma mudança importante. Ela garantiu a possibilidade de acúmulo dos benefícios, mas afastou a possibilidade de receber ambos integralmente. 

Importância da possibilidade de acumular pensão por morte com outros benefícios

O benefício de pensão por morte tem por objetivo garantir meios de subsistência aos dependentes do segurado falecido, assegurando um padrão de vida digno após a perda do provedor.

Com base na lei e na jurisprudência, a única proibição de acúmulo da pensão por morte é com o recebimento concomitante de outra pensão por morte, também deixada por cônjuge ou companheiro, no mesmo regime de previdência.

Essa ausência de restrições mais fortes para o acúmulo é, por si só, um forte indicador do quanto os benefícios previdenciários são importantes para os trabalhadores e seus dependentes. Sem eles, muitas famílias seriam deixadas em condição de extrema vulnerabilidade financeira.

Em muitos casos, o valor da pensão por morte é insuficiente para manter o sustento da família. Por isso, a possibilidade de acúmulo é uma oportunidade valiosa para quem recebe mais de um benefício previdenciário.

Embora a análise da legislação e das decisões de tribunais aponte uma visão otimista da possibilidade de acúmulo, é fundamental apresentar seu caso a um advogado especializado na área. Apenas esse profissional poderá avaliar a situação e determinar se você tem direito a receber mais de um benefício previdenciário concomitantemente.

Quer saber mais sobre o benefício de pensão por morte e a Previdência Social? Acompanhe os conteúdos do Saber a Lei!

Gilberto Vassole

Advogado atuante na área do Direito Previdenciário, Trabalhista e Direito Empresarial. Membro efetivo da comissão de direito do trabalho da OAB/SP, Pós Graduado e Mestre em Processo Civil.

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