Aposentadoria

Sou aposentado especial, posso continuar trabalhando na mesma profissão?

O grande dilema do aposentado especial é a complementação de renda.

Enquanto alguns dizem que o aposentado pode continuar trabalhando, outros falam que não e, para piorar a conversa, sempre tem uma ou outra decisão judicial nova com exceções só para te confundir.

Você, aposentado especial, deve se lembrar do polêmico tema 709 do Supremo Tribunal Federal e, logo na sequência, deve ter ouvido também sobre as exceções do mesmo tema 709.

Pois bem, já te adianto que essas exceções foram bastante específicas e voltadas para a atual crise sanitária.

Vamos abordar na sequência desse texto se o segurado entra na regra ou na exceção de impedimentos para quem recebe a aposentadoria especial.

Afinal, o aposentado especial pode ou não continuar trabalhando?

Depende, e mesmo se você entrar na exceção precisa ter bastante cuidado. Existem dois tipos de trabalho para o aposentado:

  • Em outra profissão, sem risco ou fator de insalubridade/periculosidade;
  • Na mesma profissão especial ou em outra com fator de risco.

No primeiro caso, o trabalho é permitido para qualquer aposentado especial. Ao contrário da aposentadoria por incapacidade, nessa ele não está totalmente impedido de trabalhar.

A polêmica mesmo, que deu nascimento a este texto, é o segundo caso, das profissões com exposição nociva aos agentes insalubres, o que ocorre geralmente com os profissionais de saúde, limpeza, logística pesada e transporte.

É aqui que entra o tema de repercussão geral número 709 do STF, que proibiu o retorno do aposentado especial para qualquer profissão “aposentável” pelas mesmas regras, fazendo duas ressalvas fundamentais:

  • A quem já tinha conseguido voltar para a mesma profissão por processo judicial já finalizado, podendo continuar na profissão;
  • Profissionais da linha de frente no combate à pandemia durante o estado de calamidade pública.

De qualquer maneira, o INSS precisa abrir um processo administrativo convocando a apresentação do aposentado com pedido de documentos, antes de qualquer penalização ou de corte de benefício.

Para todos os demais aposentados especiais, sem exposição direta com o contágio de COVID-19, que decidam permanecer trabalhando em atividade especial, aplica-se a restrição do artigo 57 da lei 8.213/91, já julgada constitucional pelo Supremo:

“Art. 57 […]

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 [corte de benefício] ao segurado aposentado [especial] que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.”     

Trocando em miúdos, o aposentado especial em situação de normalidade não pode exercer atividade especial sem prejuízo deste tipo de aposentadoria.

Agora para quem se aposenta por tempo de contribuição ou idade não existe nenhuma restrição de trabalho nesse sentido, com a ênfase de que o período sobressalente de trabalho não vai contar depois para fins de desaposentação ou reaposentação, já negados pelo STF em 2016.

Trabalhos proibidos para o aposentado especial

aposentado especial
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Para você que tem dúvidas do que são exatamente as atividades especiais, eu trouxe aqui uma breve lista com os principais casos.

Lembrando que a atividade especial pode ser relativizada por equipamentos eficazes de proteção ou pela exposição neutralizada ou eliminada dos agentes nocivos.

Apesar de ser uma opção arriscada, isso pode ser levado ao Poder Judiciário na prática para descaracterizar a atividade especial aplicada contra o aposentado, desde que ele tenha ao seu favor laudos técnicos de segurança do trabalho (artigo 68 do decreto 3.048/99).

Assim, ele garante permanência numa atividade tecnicamente não especial.

Veja alguns exemplos de agentes nocivos proibidos para o aposentado especial:

  • Agentes físicos: tem a ver com qualquer mal excessivo aos cinco sentidos, como ruídos, temperaturas extremas, radiação, pressão, eletricidade e altura, por exemplo;
  • Agentes químicos: tem a ver com substâncias inaláveis pela respiração ou absorvíveis pela pele, presente na manipulação de produtos químicos, contato de gases, vapor, fumaça e extração carvoeira, por exemplo;
  • Agentes biológicos: tem a ver com micro-organismos vivos, em profissões com manipulação genética, cirúrgica, laboratorial, sanitária e funerária, por exemplo.

Nunca é demais esclarecer que “para as atividades desempenhadas a partir de março de 1997, com a vigência do decreto número 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico pela Lei 8.213/91, art. 58, §1º. (TRF4, AC 5010738-72.2013.4.04.7205, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/02/2019).

Lembrando que mesmo se o laudo for emitido fora de época, ele deve prevalecer para fazer prova do período especial, sem prejuízo ao segurado.

Tecnicamente, portanto, nenhuma profissão está automaticamente desvinculada de agentes agressivos, bastando que haja avaliação técnica ambiental nesse sentido.

Imagine, por exemplo, os empregados de uma lavanderia industrial de tapeçarias. Além dos ruídos, agentes físicos ambientais, o funcionário pode estar exposto aos ácaros, agentes biológicos, pelo contato com os tapetes e sofás que chegam em péssimas condições.

O ruído nocivo pode ser identificado pela medição em decibéis, enquanto as avaliações de agentes biológicos precisam ser qualitativas, segundo as circunstâncias da jornada de trabalho, frequência, duração e intensidade do contato direto com o elemento agressor, nos termos do artigo 68 do decreto 3.048/99.

Aposentado especial na linha de frente contra a COVID-19

Aposentado especial na linha de frente contra a COVID-19
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Uma exceção interessante contra a proibição de atividade nociva pelo aposentado especial nasceu de uma medida emergencial e por isso mesmo, transitória.

Através do julgamento do tema 709 do STF, enquanto durasse o prazo de calamidade pública, ou seja, da vigência das medidas de enfrentamento à COVID-19, o aposentado especial poderia continuar trabalhando nos serviços essenciais.

Por isso, os trabalhadores envolvidos no combate pandêmico, mesmo depois da aposentadoria especial, não cairiam no risco de perder o benefício.

O leque de profissionais não abrange apenas enfermeiros e médicos, mas todos aqueles citados pelo artigo 3º-J da lei número 13.979 de 2020, envolvidos tanto no controle de doenças como na manutenção da ordem pública. Veja alguns exemplos:

  • Profissionais de limpeza;
  • Guardas municipais;
  • Coveiros e motoristas funerários;
  • Maqueiros;
  • Agentes comunitários de saúde;
  • Agentes socioeducativos e vigilantes.

Essas profissões, portanto, ainda que sejam indicativas de alta exposição perigosa ou insalubre, dão “salvo-conduto” para o aposentado especial continuar ativo.

A grande questão a se perguntar é até quando vai o estado de calamidade pública. Tanto a lei número 13.979/20 como várias outras medidas de emergência seguiram o período de vigência do decreto legislativo número 6, de março de 2.020.

Como você já deve saber, esse período só vigorou até 31 de dezembro de 2.020.

O Supremo Tribunal Federal já foi provocado pela ADI número 6.625 a se pronunciar sobre esse prazo e então, mediante liminar, o Ministro Ricardo Lewandowski prorrogou a validade dessas medidas.

A princípio, elas foram postergadas até 31 de dezembro de 2.021, inclusive no que diz respeito à lei número 13.979/20 e, desta forma, pode beneficiar os aposentados especiais nas profissões essenciais.

É importante considerar que na falta de legislação ou de regra expressa, o Ministro orienta a seguir as diretrizes da OMS (Organização mundial de Saúde) no que diz respeito às atualizações em matéria de prevenção e controle de danos à saúde e especialmente sobre a duração da pandemia.

Em todo caso, o corte de benefício pode ser judicializado para relativizar a nocividade prática da atividade, considerando o atual contexto epidemiológico, as condições fornecidas e de segurança do trabalho.

Pelo argumento, essas mesmas condições podem gerar uma prorrogação judicial da possibilidade de se manter em atividade essencial, mesmo aposentado pela especial, discutindo ou a nocividade da atividade ou o prazo de duração da pandemia.

As situações são múltiplas e é por isso que um advogado previdenciário precisa ser consultado para mais orientações.

Valor da aposentadoria especial

Valor da aposentadoria especial
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Infelizmente, o valor da aposentadoria especial mudou bastante com a reforma constitucional de 2019.

Além do novo valor de cálculo, a emenda constitucional número 103 trouxe idade mínima como um requisito complementar na regra de transição, veja só:

“Art. 19: […]

I – Aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, quando cumpridos:

a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze) anos de contribuição;

b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou

c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição”.

Cabe a lembrança de que o requisito de idade mínima só é mesmo necessário se até 2019 o segurado não cumpriu 25 anos de atividade especial, isso porque para quem já tenha cumprido esse tempo, existe direito adquirido de concessão de benefício pelas regras anteriores.

Também é importante a ressalva de que pela transição por pontos do artigo 21 da emenda 103, o critério etário não é indispensável se pelo tempo de contribuição o segurado já alcançar o número total de pontos.

É o caso de José, por exemplo, que precisa de 86 pontos: aos 55 anos de idade, os 31 anos de contribuição são suficientes para suprir todos os requisitos e permitir uma aposentadoria.

Outra possibilidade é quem trabalhou com mais de uma atividade especial sem cumprir o prazo mínimo separadamente. A vantagem é que o tempo especial ganha outro significado pela aplicação dos multiplicadores do artigo 66 do decreto 3.048/99.

A questão é que a grande maioria das atividades entra na especial 25 anos, porque sem previsão específica na lei para tempo menor, a regra geral são 25 anos trabalhados.

Você pode estar se perguntando qual é a vantagem de uma aposentadoria dessa em relação às demais sobre tempo de contribuição ou idade, e a resposta é muito simples: a contagem do tempo geralmente é melhor por conta dos multiplicadores de conversão de anos do artigo 188-P do decreto 3.048/99.

Finalmente, o valor do benefício corresponderá a 60% da média aritmética dos salários de contribuição desde 1994, com acréscimo de 2 pontos percentuais para cada ano de contribuição além do mínimo de 15 anos para mulheres ou atividade especial 15, pelo artigo 26, § 5º da Emenda 103.

O acréscimo para homens depende de pelo menos 20 anos de contribuição nas atividades: especial 20 e especial 25 anos.

Resumindo

Hoje você entendeu um pouco mais sobre o status de carreira do aposentado especial.

Sem um processo judicial favorável já finalizado, ou profissão de serviço essencial em tempos de pandemia, continuar na mesma atividade pode trazer imensos problemas ao aposentado especial.

Ele pode até permanecer na mesma profissão, mas terá o benefício de aposentadoria especial cortado ou, pior, pode vir a ter de devolver valores, se não apresentar uma justificativa legal para ter permanecido em atividade especial recebendo benefício.

Em caso de dúvidas ou para mais informações, basta iniciar o contato pelo chat do site para conversar com a nossa equipe.

Rafael Faganello

Advogado, Mestre em Direito Político e Econômico, Pós-Graduado em Direito Tributário pela FGV, Graduando em Ciências Econômicas pela FECAP. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB.

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