É possível o INSS rever ato administrativo de concessão de benefício?
Você sabia que é possível o INSS rever ato administrativo? Isso é possível conforme a legislação, porém há regras para isso. Assim, da mesma forma que o segurado pode submeter o seu benefício à revisão em busca do melhor benefício, a Autarquia pode revisar o seu benefício.
Inicialmente vamos entender do que se trata o ato administrativo e para melhor compreensão, passaremos a explorar um exemplo que aplica as regras legislativas e os pressupostos da Administração.
O que diz a legislação?
Ato administrativo não possui conceito legal, sendo os conceitos apenas doutrinários. Resumidamente consiste em um ato unilateral de vontade, que se da pela Administração Pública, produzindo efeitos jurídicos previamente estabelecidos na lei, com o intuito de modificar, extinguir, resguardar direitos visando o interesse público.
A revisão de seus atos é permitida por lei, sendo regida pela conveniência e oportunidade, que geram um poder discricionário da Administração Pública. Desta forma, não é necessário que a Administração seja provocada para agir, podendo diante da oportunidade e conveniência realizar a revisão de seus atos.
A legislação prevê a possibilidade de revisão do ato administrativo no artigo 103 – A da Lei 8.213/91, que assim prevê:
Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Como visto, é possível a realização da revisão do ato administrativo, podendo o anular, contudo há um prazo para fazer isto, que é de 10 anos.
Em relação a este prazo decadencial, a Instrução Normativa 77/2015 do INSS, supriu dúvidas quanto a data de início da contagem do prazo, em consonância com o entendimento do STJ:
Art. 569. O direito da Previdência Social de rever os atos administrativos decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º Para os benefícios concedidos antes do advento da Lei nº 9.784, de 1999, ou seja, com DDB até 31 de janeiro de 1999, o início do prazo decadencial começa a correr a partir de 1º de fevereiro de 1999.
§ 2º Para os benefícios com efeitos patrimoniais contínuos, concedidos a partir de 1º de fevereiro de 1999, o prazo decadencial contar-se-á da data do primeiro pagamento.
Como é de conhecimento geral, o pente fino do INSS é um ótimo exemplo de revisão de ato administrativo, que ocorre quando a Autarquia investiga irregularidades na concessão de benefícios, fatos geradores não mais presentes, realizando a cessação de inúmeros benefícios que já perderam o objeto ou então que foram concedidos de maneira incorreta.
Portanto, rever ato administrativo tem por objetivo corrigir um equívoco ou irregularidade, sendo que esta revisão decorre do Poder Discricionário da Administração Pública, ou seja, a revisão é um ato inerente ao ato administrativo, podendo inclusive ser realizada de ofício.
Qual o entendimento jurisprudencial?
O Supremo Tribunal Federal já se posicionou quanto ao tema pelas seguintes Súmulas:
473 – A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque dêles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
346 – A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Ainda que realizada a revisão de ofício, é necessário oportunizar ao beneficiário o contraditório e a ampla defesa. Desta forma, ao ser notificado do processo administrativo, este pode apresentar defesa.
Ponto essencial a ser destacado é o caso da má-fé. Caso reste comprovado que o segurado agiu de má-fé ao ter o benefício concedido e passado o prazo decadencial de 10 anos, o INSS não pode mais revisar o ato administrativo?
Um exemplo de má-fé é o caso de pessoa que recebe aposentadoria por incapacidade permanente, que é aquela concedida nos casos em que não é possível o retorno a sua atividade habitual e sequer a reabilitação para o desempenho de atividade diversa, contudo o segurado continua trabalhando, cumulando duas rendas. Desta forma, comprovada a má-fé do beneficiário, é afastado o prazo decadencial.
Foi o que decidiu recentemente o Tribunal Regional da 4ª Região ao condenar a segurada a devolver valores pagos à título de aposentadoria por incapacidade permanente ao INSS, tendo em vista que recebeu o benefício de forma indevida.
No caso, ficou comprovada a má-fé da beneficiária que continuou exercendo mais de uma atividade remunerada mesmo recebendo aposentadoria por incapacidade. A aposentadoria havia sido concedida em 1995, contudo, ao realizar a revisão do benefício, foi constatado o vínculo empregatício, sendo considerado, portanto, questão de retorno voluntário ao trabalho, o que gera a cessação do benefício.
Desta forma, foi condenada a devolver os valores recebidos no período de 2007 a 2012. Em sede de apelação, foi alegado que o salário de benefício era extremamente baixo o que a obrigou a realizar outras atividades, as quais constavam inclusive no sistema CNIS. O Tribunal, portanto, considerou o ato de má-fé, pois a apelante estava cumulando duas rendas indevidamente, confirmando a sentença.
Portanto, deve-se atentar a esta exceção, tendo em vista que há a presença do direito adquirido no caso de passados os 10 anos da concessão do benefício, porém, se demonstrada a má-fé do beneficiário, este prazo decadencial será afastado, podendo ser anulado o ato administrativo. Caso demonstrada a boa-fé, não é compelido a realizar a devolução dos valores.
Na hipótese do segurado não concordar com este cancelamento, deve recorrer ao Poder Judiciário para que tal decisão seja revertida e seu benefício restabelecido.
Considerações finais
Conforme esclarecemos no decorrer desse texto, é possível que o INSS proceda com a revisão de um ato administrativo dentro do prazo decadencial, desde que exista má-fé do segurado que eventualmente tenha recebido um benefício indevidamente.
Desta forma, dentro do prazo decadencial de 10 anos, a Autarquia pode rever ato de concessão de benefício, podendo o mesmo ser cessado em face de um equívoco ou irregularidade quanto à sua manutenção. Caso reste demonstrado que o beneficiário não contribuiu para esta irregularidade, ou seja, agiu de boa-fé, não está obrigado a realizar a devolução dos valores recebidos.
Contudo, este prazo não se aplica no caso de comprovação de má-fé do beneficiário ao receber o benefício, como foi o caso explicitado no recente julgado do TRF4, em que recebendo beneficio de aposentadoria por incapacidade permanente concomitantemente a segurada exercia atividades remuneradas, sendo condenada a ressarcir o INSS, pois não há compatibilidade no recebimento das duas rendas.