Tutela Provisória no Direito Previdenciário
A tutela provisória no Direito Previdenciário está em evidencia atualmente, tendo em vista que um entendimento já pacificado nos Tribunais voltou a pauta. O próprio STJ está revendo o Tema 692, que versa sobre a devolução de valores por conta da tutela antecipada que foi revogada.
Em razão da natureza alimentar dos benefícios previdenciários, bem como o caráter prejudicial do entendimento atual, houve a proposta de revisão deste tema. Vamos entender melhor essa situação agora.
O que é tutela provisória?
A tutela provisória se diferencia da tutela definitiva, em razão do momento em que são concedidas. A primeira é concedida no início ou curso do processo, momento em que é feita a chamada cognição sumária, ou seja, através do mínimo de provas presentes do processo até o momento. Já a tutela definitiva, há ampla produção de provas, com a cognição exaustiva, com a solução do conflito de forma definitiva.
Nesse sentido, há dois tipos de tutela provisória. Vejamos:
A tutela de urgência, prevista no artigo 300 e seguintes do Código de Processo Civil, se divide em antecipada e cautelar. Nestes casos são necessários os seguintes requisitos:
- A probabilidade do direito (fummus boni juris);
- Perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).
A tutela antecipada é a mais comum nos processos previdenciários, tendo em vista que ela antecipa o resultado final do processo, assim, está diretamente ligada ao mérito do processo, antecipando a pretensão da parte. Por exemplo, requerimento de auxílio por incapacidade temporária, em que a tutela é concedida, determinando que desde então seja pago pelo INSS o benefício.
Ainda, conforme o §3º do referido artigo “A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”.
Já a tutela cautelar está mais ligada a parte de instrução processual. Visa assegurar a efetividade do direito, recaindo sobre bens, pessoas e provas. Temos por exemplo uma testemunha que está arrolada para ser ouvida, porém, em decorrência de uma doença que a acomete não poderá esperar até a data designada para prestar seu testemunho. Pode então ser requerida a tutela cautelar para que ela seja excepcionalmente ouvida antes, garantindo a produção daquela prova.
Agora sim o outro tipo de tutela provisória, a tutela de evidência será concedida independente da demonstração do perigo de dano, dentro das hipóteses previstas no artigo 311 do Código de Processo Civil:
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
Um exemplo de tutela de evidência é quando ao requerer a implantação de benefício previdenciário, demonstrada a probabilidade do direito o INSS não coopera com o andamento do processo, podendo em razão disso ser requerida a tutela de evidência, para preservação do direito do segurado que está sendo prejudicado pela atuação protelatória da Autarquia.
Outra diferença entre os dois tipos de tutela provisória, é que a tutela de urgência pode ser requerida em caráter antecedente ou incidental. Já a tutela de evidência apenas em caráter incidental, que é quando pleiteada no curso do processo.
Ademais, há a chamada estabilidade da tutela concedida de forma antecedente em caso de não ser impugnada a decisão que a concedeu.
Em relação a tutela provisória no direito previdenciário, a doutrina entende que não havendo prazo decadencial ou prescricional de fundo de direito para a concessão de benefício, os efeitos da decisão que concedeu a tutela antecipada, tornam-se inalteráveis caso a Autarquia não ingressar com ação para sua invalidação, revisão ou reforma dentro do prazo de dois anos, em razão do princípio da segurança jurídica. Contudo, é importante destacar que a estabilização não impede a atividade administrativa do INSS no caso de convocação de perícia periódica.
Ou seja, trata-se de uma decisão precária que quando não mais presentes os requisitos que ensejaram sua concessão, pode ser revogada. Desse modo, podendo ser revogada há atual controvérsia em relação a tutela provisória no direito previdenciário e a devolução dos valores recebidos durante o período de tal vigência.
O que diz o STJ sobre a tutela provisória no Direito Previdenciário?
O Princípio da Irrepetibilidade de benefícios, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, determina que caso o segurado que tenha recebido valor decorrente de benefício que foi concedido de forma indevida, não tem o dever de devolver quando o recebimento foi de boa-fé.
Contudo, quando se trata de tutela provisória no direito previdenciário como acima estudado, o STJ possui o entendimento por meio do Tema 692, fixado em 2015, de que “a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”.
Ocorre que foi proposta a revisão deste entendimento, por meio da Questão de Ordem no REsp .734.698/SP.
Os fundamentos giram em torno da necessidade de ser feita uma análise mais ampliada desta questão. Ademais, há a necessidade de revisão tendo em vista a flexibilização deste entendimento no momento em que o STJ entende não ser suscetível de devolução os valores recebidos a título de benefício previdenciário nos casos de recebimento por força de sentença, a qual é reformada em sede de recurso especial, tendo em vista que nestes casos houve a dupla confirmação dos valores devidos, sendo que apenas chegando ao STJ houve a reforma.
Assim, o entendimento até então era de que apenas os valores recebidos por força de tutela antecipada revogada em sentença ou em segunda instância estariam sujeitos a devolução.
Porém, a proposta de revisão tem embasamento no Princípio da Confiança, tendo em vista que aquele segurado que recebe o benefício por meio de tutela provisória o recebe de boa-fé, não sendo caso de devolução dos valores. Diferente do caso em que recebido de má-fé, situação que inclusive é causa excludente da aplicação do Princípio da Irrepetibilidade dos Benefícios.
Ademais, o fato de ter sido concedida por decisão precária não retira a natureza alimentar do benefício, se mostrando irrazoável o entendimento do Tema 692.
Na via administrativa, o Tema 979 do STJ que se refere a concessão administrativa de benefícios, no caso de haver interpretação errônea ou má aplicação da lei. Esta controvérsia está pendente de julgamento, sob o rito dos recursos repetitivos, devendo ser analisada a questão de ser caso de devolução ou não dos valores recebidos de boa-fé.
Processos suspensos
De acordo com o artigo 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil, há a determinação de suspensão nacional dos processos que versem sobre os temas que estão afetados. Assim, caso os processos sejam individuais ou coletivos, pendentes de julgamento que versem sobre a tutela provisória no direito previdenciário e a devolução de valores, ficam suspensos até a resolução da controvérsia.
Considerações finais
Como visto, o tema da devolução de valores recebidos por força de tutela provisória é muito delicado, porém é indispensável a sua revisão, pois passa a gerar imenso prejuízo aos beneficiários, afinal, como é cediço, os processos judiciais podem demorar muito tempo para sua conclusão, sendo que da tutela provisória até a sentença ou decisão de segundo grau, anos podem se passar.
Além do mais, no âmbito previdenciário aplica-se o Princípio da Irrepetibilidade de Benefícios e o Princípio da Confiança, os quais estão presentes em inúmeros casos, como referido no caso de sentença que concedeu o benefício e foi reformada em sede de recurso especial.
Deste modo, a revisão se funda na necessidade destes princípios também serem aplicados nos casos do beneficiário que recebeu o benefício de boa-fé em sede de decisão precária e que após a decisão definitiva tem o benefício negado, a fim de gerar inclusive segurança jurídica.
Assim, vamos aguardar o resultado desta importante revisão do Tema 692 do STJ, a qual pretende analisar situações específicas da concessão da tutela provisória no direito previdenciário e sua eventual revogação, a fim de dar fim a essa controvérsia.