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Como considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário

Existem vários motivos pelos quais você precisa buscar um planejamento previdenciário – e, quanto antes, melhor. Um deles é que, com o planejamento, é possível computar tempo de contribuição para a aposentadoria que você talvez nem saiba que tinha. Por exemplo, você sabia que é possível considerar o período de aluno aprendiz e estágio?

A maioria das pessoas acredita que apenas “trabalho de verdade”, aquele com carteira registrada, é considerado como tempo de contribuição. No entanto, existem muitas modalidades de vínculo de trabalho. 

Nem todo vínculo de trabalho é um vínculo de emprego. Mesmo entre as outras modalidades de vínculo, muitas são considerados de alguma forma na hora de solicitar benefícios da Previdência Social, como a aposentadoria.

Neste artigo, você vai entender melhor como é possível considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário. Assim, esses vínculos de trabalho vão colaborar para que você acumule mais tempo de contribuição e possa receber sua aposentadoria no momento certo. 

Como considerar o período de aluno aprendiz 

Como considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário
Como considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário 5

A maioria das decisões de Tribunais já reconhece que o aluno aprendiz é um segurado do INSS, da modalidade empregado, exatamente como um trabalhador com carteira assinada. Para esse reconhecimento, basta que ele receba remuneração da empresa na qual trabalha.

Nem sequer é preciso que a remuneração seja um salário. Até remunerações indiretas – como uniformes de trabalho, vale alimentação ou auxílio para compra de material escolar – produzem esse efeito.

Um bom exemplo de como os Tribunais entendem a questão pode ser vista em uma das decisões do STF, segundo a qual:

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou-se, em casos idênticos ao que ora se analisa, pela legalidade do cômputo do tempo prestado como aluno-aprendiz para fins de aposentadoria. (STF MS 28.399-AgR)

Esse entendimento de que o aluno aprendiz é segurado empregado do INSS foi formalizado em súmulas, como a Súmula 24 da Advocacia-Geral da União:

É permitida a contagem, como tempo de contribuição, do tempo exercido na condição de aluno-aprendiz referente ao período de aprendizado profissional realizado em escolas técnicas, desde que comprovada a remuneração, mesmo que indireta, à conta do orçamento público e o vínculo empregatício.

Mais recentemente, esse entendimento também entrou na legislação. O Decreto 10.410, de 2020, inseriu no Decreto 3.048, de 1999, um novo artigo sobre o assunto.

Art. 188-G.  O tempo de contribuição até 13 de novembro de 2019 será contado de data a data, desde o início da atividade até a data do desligamento, considerados, além daqueles referidos no art. 19-C, os seguintes períodos:

IX – o tempo exercido na condição de aluno-aprendiz referente ao período de aprendizado profissional realizado em escola técnica, desde que comprovados a remuneração pelo erário, mesmo que indireta, e o vínculo empregatício. 

Se o assunto terminasse aqui, seria bastante simples. Porém, o TCU – Tribunal de Contas da União estabelece que não basta demonstrar o recebimento de remuneração. 

Para que seja possível considerar o período de aluno aprendiz, o TCU considera essencial a prova do labor. Em outras palavras, deve haver a comprovação de que o estudante trabalhou atendendo encomendas de terceiros.

A Turma Nacional de Unificação editou em 2020 uma nova versão de sua Súmula 18, que trata desse assunto. Nessa súmula, é possível ver uma lista mais explícita dos critérios para contabilização do período de aluno aprendiz como tempo de contribuição.

Para fins previdenciários, o cômputo do tempo de serviço prestado como aluno-aprendiz exige a comprovação de que, durante o período de aprendizado, houve simultaneamente: (i) retribuição consubstanciada em prestação pecuniária ou em auxílios materiais; (ii) à conta do Orçamento; (iii) a título de contraprestação por labor; (iv) na execução de bens e serviços destinados a terceiros.

Como considerar o período de estágio

Como considerar o período de estágio
Como considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário 6

Ao contrário do aluno aprendiz, o estagiário não é considerado um segurado empregado. Na realidade, ele nem mesmo é considerado um segurado obrigatório – categoria que engloba os empregados e os contribuintes individuais. 

O estagiário só precisa recolher contribuições se quiser, por iniciativa própria. Ele pertence à categoria dos contribuintes facultativos e, portanto, é um segurado facultativo. Veja o que diz o Decreto 3.048 sobre essa categoria:

Art. 11.  É segurado facultativo o maior de dezesseis anos de idade que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, na forma do art. 199, desde que não esteja exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência social.

§ 1º Podem filiar-se facultativamente, entre outros:

VII – o estagiário que preste serviços a empresa nos termos do disposto na Lei nº 11.788, de 2008

Justamente por esse motivo, como regra, não é possível considerar o período de estágio como tempo de contribuição, a menos que o estagiário esteja contribuindo por iniciativa própria. No entanto, toda regra tem sua exceção.

É possível considerar o período de estágio se ficar comprovado que a atividade de estágio foi desenvolvida de forma irregular, caracterizando, na prática, um vínculo empregatício.

Você provavelmente conhece um caso como esse ou já passou por essa situação. O estudante é contratado como estagiário. Porém, na prática, a empresa exige que ele cumpra carga horária ou desenvolva tarefas que correspondem a um empregado. 

Se for possível provar que a relação entre o estagiário e a empresa violou as normas da Lei do Estágio, a Lei 11.788 de 2008, então o período de estágio pode ser considerado como tempo de contribuição.

Para ser um pouco mais técnico, o que acontece é que o vínculo de estágio passa a ser reconhecido como vínculo empregatício. Nesse tipo de vínculo, a responsabilidade de recolher contribuições para o INSS é do empregador. O empregado não pode ser prejudicado porque o empregador não fez o recolhimento.  

Portanto, o período correspondente a esse vínculo de estágio/empregatício é considerado como tempo de contribuição ficto, fictício. Isso significa que, apesar da contribuição não ter sido efetivamente realizada, o tempo é contado da mesma forma para fins de aposentadoria – ou outros benefícios previdenciários.

O caminho mais adequado para o reconhecimento do vínculo empregatício entre “estagiário” e empresa é por meio de um processo trabalhista. Veja o que o TST disse em um exemplo de caso no qual o contrato de estágio foi declarado nulo e o vínculo empregatício foi reconhecido:

Conhecer do recurso de revista da reclamante quanto a este último tema, por violação do art. 3°, §§1° e 2º, da Lei 11.788/2008, e, no mérito, dar-lhe provimento para declarar a invalidade do contrato de estágio, reconhecer o vínculo de emprego com a reclamada no período de 04/08/2008 a 10/01/2010 (TST ARR 338-57.2013.5.04.0009)

Vale a pena lembrar que, nesses casos, é o empregador que deverá acertar as pendências com o INSS ou sofrer as eventuais sanções pela falta do recolhimento das contribuições devidas.

Porque considerar o período de aluno aprendiz e estágio

Porque considerar o período de aluno aprendiz e estágio
Como considerar o período de aluno aprendiz e estágio no planejamento previdenciário 7

Para considerar o período de aluno aprendiz e estágio na contagem do tempo de contribuição, inevitavelmente será preciso envolver-se em processos administrativos ou judiciais. 

No caso do aluno aprendiz, é preciso comprovar que estão presentes os quatro critérios: remuneração direta ou indireta, despesa ao orçamento público, exercício de atividade de trabalho e atendimento de demandas de terceiros.

No caso do estagiário, é preciso comprovar que a natureza do vínculo, na prática, era de emprego. Para isso, é preciso demonstrar que as normas que regulam o estágio foram violadas de alguma forma.

Esse esforço vale a pena? Em muitos casos, a resposta é sim. Havendo sucesso para considerar o período de aluno aprendiz e estágio, é possível acrescentar meses e até anos ao tempo de contribuição. Isso representa um adiantamento significativo do prazo para ter acesso ao benefício da aposentadoria, ou a outros benefícios da Previdência Social.

Colocando de outra forma, considerar o período de aluno aprendiz e estágio pode ser uma chave para alcançar o objetivo central do planejamento previdenciário: garantir que você tenha acesso à aposentadoria no momento certo e com o valor justo. 

Porque fazer planejamento previdenciário

Antes de encerrar esse artigo, vamos retomar brevemente o que é planejamento previdenciário e porque ele é tão importante.

O planejamento previdenciário é realizado por um advogado especialista na área de Previdência. Ele analisa o seu caso e desenha estratégias para otimizar suas contribuições para o INSS. 

O planejamento favorece pessoas em várias situações. É o caso de quem passou algum tempo sem recolher contribuições porque não tinha vínculo empregatício formal ou porque seu salário de contribuição estava abaixo do limite mínimo. No entanto, quem sempre recolheu as contribuições previdenciárias regularmente também pode se beneficiar.

Com o planejamento, é possível ter uma contagem de tempo de contribuição mais favorável. O resultado é que você consegue alcançar mais facilmente o tempo exigido para receber benefícios como a aposentadoria.

Outra vantagem importante é que o profissional pode encontrar formas de aumentar a base de cálculo dos benefícios. Dessa forma, você receberá uma aposentadoria com valor mais atrativo. 

Nós preparamos um material completo sobre o planejamento previdenciário e seus benefícios. Confira o artigo e entenda a importância de programar a aposentadoria.

Rafael Faganello

Advogado, Mestre em Direito Político e Econômico, Pós-Graduado em Direito Tributário pela FGV, Graduando em Ciências Econômicas pela FECAP. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB.

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