A COVID-19 gera Aposentadoria por Invalidez?
É correto sugerir que a COVID-19 gera aposentadoria por invalidez (incapacidade permanente)? Sim! De antemão já dizemos que sim, pois a lei exige além da qualidade de segurado, que os sintomas de doença sejam de tal gravidade que impossibilitem a continuidade do trabalho pelo segurado.
Necessário esclarecer que não são todos os segurados que contraíram o vírus que terão direito à aposentadoria por invalidez, atual aposentadoria por incapacidade permanente, pois os efeitos do vírus e as sequelas advindas da contaminação é diferente de uma pessoa para outra e em algumas hipóteses a incapacidade total e permanente pode ser constatada em uma pessoa e em outra não.
A questão provoca dúvidas porque a doença é muito recente, e talvez, exatamente por isso, pela ciência ainda não tê-la controlado e combatido de forma eficaz e definitiva, eventuais sequelas e danos graves à saúde do trabalhador podem acarretar limitações físicas e psíquicas que deflagram uma impossibilidade clínica do trabalhador retornar às suas ativadas habituais por tempo indeterminado.
Há uma série de outras questões que acompanham a modernidade dos tempos de eclosão da COVID-19, como a teleperícia, ou atendimento médico à distância. Vejamos as adaptações integradas pelo INSS e os posicionamentos jurídicos que surgem.
Conceito e características da doença
A COVID-19 gera aposentadoria por incapacidade, se a limitação for grave, completamente incapacitante e de improvável recuperação, mesmo após a realização do tratamento clínico e de reabilitação profissional.
A doença é transmissível por gotículas de saliva, por meio do contato com outra pessoa doente que porte o vírus SARS-CoV-2. Para evitar a doença, portanto, a melhor forma é impedir o contágio, com higienização frequente das mãos e o uso de máscaras (elas funcionam como barreira física, que impede a projeção de saliva e fluidos contaminados em quem estiver por perto).
Ainda não se conhece os critérios para o comportamento mais ou menos grave no organismo do infectado, o que se sabe é que comorbidades, como doenças crônicas e alguns fatores como idade e peso pioram os riscos de resposta grave. No pior cenário, a infecção compromete as vias respiratórias, agravando os pulmões e levando o paciente à morte.
Veja os sintomas iniciais que indicam um possível contágio:
- Febre;
- Tosse seca;
- Diarreia;
- Dor de cabeça;
- Fadiga;
- Perda de paladar ou olfato e descoloração dos dedos.
Sintomas graves: - Pressão e dor no peito;
- Dificuldade respiratória, inflamação nos pulmões;
- Capacidade motora alterada.
Sequelas pós-COVID até então reportadas: - Redução da capacidade pulmonar;
- Fadiga e falta de ar após a recuperação;
- Fibrose pulmonar (doença crônica nos pulmões);
- Perda de força muscular, motora, prejuízo cognitivo, da memória e raciocínio;
- Doenças do coração, intestino e rins.
É pelo potencial de gravidade que a COVID-19 vem sendo conhecida como doença sistêmica e não somente como doença respiratória. O estado de recuperação pode durar meses, o que exige certo investimento de tempo e dinheiro em equipamentos de reabilitação, como fisioterapia e outros exercícios específicos.
De qualquer forma, é muito possível que as sequelas gerem dano grave e permanente sobre a qualidade de vida e a atividade profissional do segurado doente.
Como a incapacidade é analisada? A COVID-19 gera aposentadoria?
A incapacidade permanente deve ser investigada por perícia multidisciplinar, por conta do INSS, que resulte na inaptidão definitiva e completa para o trabalho no caso do segurado, avaliando fatores pessoais como qualidade de vida, queda da produtividade, responsividade do tratamento, ambiente de trabalho, acessibilidade.
A princípio, o contágio da COVID-19 com quarentena permite a concessão de benefício por incapacidade temporária. A aposentadoria só se justificaria pela continuidade de gravames na saúde, por sequelas ou sintomas imprevisíveis que afetem, de fato, a atividade laborativa diária.
No ato da perícia, o segurado poderá requisitar a presença de médicos particulares de sua confiança e às próprias expensas (artigo 213, § 1º, instrução normativa número 77/2015).
É preciso atestar o afastamento total das atividades e a incapacidade completa sobre todos os trabalhos usualmente exercidos pelo segurado, lembrando que a incapacidade parcial poderá viabilizar o auxílio-acidente ou o auxílio-doença, mas não a aposentadoria por incapacidade.
Todos os exames e laudos em posse do segurado podem ser apresentados para a análise conjuntural do seu quadro de saúde, além do que são essenciais para fixar com melhor precisão a data de início da doença e a data de início da incapacidade (artigo 304, § 1º, instrução normativa 77/2015).
Em matéria de COVID-19, é muito comum, por exemplo, que a pessoa não manifeste sintomas iniciais, vença o período de transmissibilidade, mas apresente limitações pós-COVID, como cansaço anormal ou queda qualitativa do quadro de saúde geral.
Judicialmente, o juiz analisa a perícia, mas não se apoia exclusivamente nela, considerando os elementos particulares trazidos pelo segurado interessado e também pelos depoimentos que possam corroborar com a demonstração da vida diária prejudicada do segurado.
São avaliados os fatores de presença de sintomas, afastamentos por auxílio-doença, tipo de função desempenhada, segurança do ambiente do trabalho, eficácia do tratamento, comorbidades, entre outros elementos de interação entre a doença, o segurado e seu meio.
Ainda que a incapacidade seja considerada permanente e a aposentadoria concedida, o segurado poderá ser convocado a qualquer tempo para revalidação da perícia e confirmação da incapacidade (artigo 46 do decreto 3.048/99), a não ser que já tenha completado 60 anos de idade (artigo 46, § 2º, decreto 3.048/99).
De qualquer modo, a incapacidade deve ser deliberada em relação à profissão, ponderando-se o comprometimento ou não de habilidades necessárias para a demanda profissional, como a concentração, raciocínio, memória, vida independente, comunicação, trabalho, aprendizado, sono, relação interpessoal, integridade física, considerando se as sequelas da COVID são agravantes ou não de alguma dessas atividades.
Não há consenso médico, até o presente momento, sobre a indicação de cura total do paciente, variando bastante, os sintomas pós COVID-19. O tempo de intubação e manutenção na UTI, também são capazes de fixar a qualidade de vida imediatamente posterior do indivíduo que é devolvido para a vida em sociedade.
Os contribuintes facultativos (que pagam o INSS, mas não possuem atividade remunerada) e os segurados em período de graça (que perderam o emprego ou pararam de pagar o INSS há menos de um ano, em regra), possuem direito a receber o auxílio-doença se contraírem COVID-19, desde que haja um elemento incapacitante, ainda que temporário (Coronavírus e os Impactos Trabalhistas, p. 634, Editora JH Mizuno, Edição do Kindle).
Posteriormente, esse auxílio poderá ser convertido em aposentadoria por incapacidade, mediante perícia do INSS.
A aposentadoria por incapacidade ganha método de cálculo diferente se a COVID-19 foi contraída no trabalho (imagine pessoas que laborem na linha de frente no combate ao COVID, ou que exerçam atividades com exposição ao contágio). Neste caso, o valor financeiro será maior.
O benefício relacionado à doença ocupacional, ou acidente de trabalho, será de 100% sobre o salário de benefício, enquanto o mesmo benefício para trabalhadores fora de um cenário de exposição por causa profissional será de 60% mais 2% por ano contribuído, que extrapole 15 anos de contribuição para mulheres e 20 anos de contribuição para homens. A mesma variação de cálculo é aplicada para a pensão por morte, se o segurado falecer em razão da COVID-19 (artigo 44 do decreto 3.048/99).
Adicional de 25% para aposentados por incapacidade
Segundo o artigo 45 da lei 8.213/91, “o valor da aposentadoria por incapacidade do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25%”.
A necessidade desse auxílio também é verificada por perícia, e, excepcionalmente, esse adicional poderá extrapolar o teto previdenciário para o pagamento do benefício (R$ 6.433,57 em 2021).
Este valor não é incorporado pela pensão por morte quando o segurado assistido vier a falecer, além disso, todo ano, quando o benefício da aposentadoria for reajustado, o adicional acompanhará o reajuste.
A assistência de terceiros em favor do segurado deve ser permanente e ela pode ser física, motora ou mental (cuidadores, enfermeiros, etc), não sendo suficiente a ajuda ocasional. O pedido poderá ser feito no portal eletrônico MEU INSS ou pelo aplicativo de celular, no momento do requerimento da aposentadoria ou após a concessão dela.
O comprometimento motor e muscular dos pacientes que permaneceram por muito tempo na UTI pode desencadear restrições na mobilidade e vida independente do afetado, como atividades cotidianas de alimentação, banho, compras de supermercado, serviços bancários, etc. Esse fator pode ocasionar o pedido do adicional sobre a aposentadoria. Em eventual reestabelecimento do enfermo, a perícia pode ser renovada e o adicional será mantido ou não a depender do resultado do laudo.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece a concessão do adicional para qualquer aposentadoria, desde que haja a assistência permanente de terceiros em relação ao aposentado. Podemos dizer, portanto, que o adicional diz muito mais sobre a situação do segurado em si do que sobre a doença (REsp 1648305/RS e REsp 1720805/RJ, tema número 982 do STJ).
Como requerer o benefício?
Os primeiros procedimentos para a aposentadoria por incapacidade podem ser realizados integralmente pela internet ou por agendamento telefônico pelo número “135”. A perícia será marcada pelo INSS em data que poderá ser visualizada no próprio aplicativo. O segurado deverá comparecer em posse de todos os seus documentos e dos exames médicos correspondentes.
A pessoa que optar por baixar o aplicativo no celular (MEU INSS), deverá fazer um cadastro com usuário e senha para ingressar no portal, pelo número de CPF do segurado e uma senha vinculada. No menu de serviços, escolha o campo “agendar perícia”, nele você poderá clicar em “perícia inicial”, se nunca se submeteu a nenhuma, “perícia de prorrogação”, se você já usufrui de um benefício, ou, ainda, “remarcar a perícia” (se já foi agendada).
O aposentado em razão de sequelas de COVID-19 terá o contrato de trabalho suspenso, como manda o artigo 475 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), isso porque a aposentadoria por incapacidade não é um benefício necessariamente definitivo, em face da possibilidade de reabilitação do segurado pela convocação pericial.
É preciso lembrar, ainda, que devido ao estado de calamidade pública, os empregadores foram autorizados a suspender temporariamente o contrato de trabalho de seus empregados por até 180 dias no ano de 2020 (Lei número 14.020/20), inclusive de aposentados, desde que oferecessem contrapartida indenizatória ao empregado suspenso.
Essa é uma espécie de garantia e estabilidade provisória originada da lei, e assim como a aposentadoria por incapacidade mencionada pelo artigo 475 da CLT não possui caráter definitivo, a estabilidade em razão de COVID-19 também não. A grande diferença fica a cargo do empregado poder ou não abrir mão dessa vantagem.
Na estabilidade por suspensão de contrato por COVID-19, o trabalhador poderá abrir mão de sua garantia e receber verbas rescisórias sem indenização. Já na aposentadoria por incapacidade, até que o empregado tenha alta do INSS ele não pode pedir demissão.
Eventuais tentativas de extinção do contrato de trabalho neste contexto exigem a judicialização da questão na Justiça do Trabalho competente, devendo o trabalhador comprovar a irreversibilidade da aposentadoria para obter algum ganho de causa (em razão da idade, por exemplo, as perícias deixam de ser convocadas e a aposentadoria se consolida como estável, via de regra).
É por esse motivo que as perícias são tão importantes na avaliação das condições pessoais do beneficiário, pois ainda que a doença seja concebida como grave, é necessário saber se o segurado se habilitaria ou não para o desempenho da mesma ou de novas atividades, se sua incapacidade tende a ser reversível ou não (TRF4, APELREEX 0014778-40.2016.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, D.E. 05/10/2018).
Em caso de indeferimento da aposentadoria por incapacidade pelo INSS, o segurado deverá consultar um advogado previdenciarista para analisar as causas do indeferimento e buscar a solução mais adequada, seja pela propositura de uma ação judicial.
Várias portarias lançadas no ano de 2020 pelo Ministério da Economia prestigiaram o atendimento remoto em detrimento do atendimento presencial do INSS. É preciso constar que os trabalhadores compulsoriamente segregados, que se afastaram do trabalho para isolamento social, continuam segurados ao INSS mesmo diante da interrupção do pagamento de contribuições pelo prazo de até 12 meses após a segregação (artigo 15, III, lei 8.213/91).
Basta acessar o portal MEU INSS e sempre consultá-lo para conferir o andamento de seus requerimentos, eventuais necessidades adicionais de documentação, perícias e decisões administrativas. Em dezembro de 2020, as perícias presenciais já foram retomadas, mas o agendamento é realizado exclusivamente pelo telefone (número 135) ou pelo portal da internet MEU INSS.
Para a concessão da aposentadoria por incapacidade, o beneficiário deve demonstrar que é segurado do INSS (que paga contribuições em dia), para tanto, precisa apresentar sua carteira de trabalho ou carnês de contribuição previdenciária sempre que pedir um benefício.
Para aqueles que nunca contribuíram ao INSS, se a renda individual e familiar não ultrapassar ¼ de salário mínimo, é possível que a pessoa com sequelas, em razão de COVID -19, aufira benefício assistencial de um salário mínimo mensal pelo BPC/Loas, na conformidade dos artigos 203, V, da Constituição Federal e do artigo 20 da Lei Orgânica de Assistência Social (TRF4 5005519-62.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 13/03/2019).
Teleperícia no INSS
Algumas inovações no INSS resolveram acompanhar a evolução tecnológica atual para otimizar o gerenciamento dos históricos previdenciários e impulsionar a análise de benefícios pelos órgãos previdenciários.
A intenção é reduzir gastos, melhorar o aproveitamento do tempo, manejar o déficit de servidores pela implantação de inteligência artificial e evitar o deslocamento indiscriminado de segurados para as agências.
Em 2020 o INSS busca a integração de dados gerais do seu sistema, como o Dataprev, com o sistema eletrônico do Poder Judiciário, de modo a melhorar a comunicação entre as decisões judiciais e a atualização previdenciária do segurado no INSS.
O aplicativo de celular MEU INSS e o portal eletrônico à disposição do segurado, possuem suporte para o início de um número significativo de requerimentos de benefício, agendamentos de perícias, consulta de extratos, recursos e intercâmbio de informações. A cada dia que passa o apoio tecnológico procurar trazer mais comodidade e rapidez.
A concepção da teleperícia como uma realidade no INSS surge dentro desse contexto, de otimização da prestação do serviço público, associada à inconveniência do contato físico em tempos de risco de contágio por COVID-19.
A determinação dessa necessidade veio do Tribunal de Contas da União (TCU) e das recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), responsáveis, respectivamente, pelas contas públicas e pela vigília dos direitos cidadãos.
A matéria é controversa, porque esbarra na opinião corporativa do Conselho Federal de Medicina, que até então proibia a perícia virtual sem exame direto (parecer número 3/2020).
Breves conclusões
Não podemos descartar a hipótese de que a Covid-19 gera aposentadoria por incapacidade permanente. A matéria é delicada, porque ainda não foi exaustivamente regulamentada ou trazida aos Tribunais do país para uma resposta uniforme.
As perícias continuam sendo substanciais e indispensáveis na concessão de qualquer benefício por incapacidade, temporária ou permanente. É aconselhável que o segurado junte o máximo possível de documentos que atestem seu quadro de saúde, inclusive no cenário pós- COVID (resultado de exame positivo para o vírus, tratamentos e medicamentos prescritos, comprovação de internação, indicação de sessões de fisioterapia, chapas dos órgãos debilitados, dispensas do trabalho, etc.).
Acredito que a essa altura, o segurado já tenha compreendido que não há uma fórmula certa para levar à concessão do benefício, pois a doença reage de forma muito particular para cada indivíduo e, por esse motivo, as circunstâncias pessoais e efetivas devem ser analisadas em um contexto individualizado.
Contrate um advogado especializado com experiência e competência para auxiliá-lo e para sanar todas as dúvidas sobre benefícios, procedimentos e indeferimentos no INSS.